Não foi ali que nasceu. Habitada por tias solteiras, mui pias, que nas férias diversas a mimavam - até aos cinco anos enrolavam caracóis desordenados em canudos; anos depois, cruzavam tranças castanho-escuro, serviam almoços saídos do forno a lenha, merendas com pão de trigo, centeio sem mistura, fatiado na hora, com manteiga, cozido no forno comunitário por mulher sabedora e diligente, queijo da serra, compotas e marmelada caseiras. E recusava sesta, prometia baixo o volume de som das risadas e gritos contentes, evitava juras de não andar descalça na terra fofa e grávida de bens. Ansiava pelo silêncio, moldura do sono das ancestrais, como silencioso chamamento da liberdade precária por três horas. Pelas cinco, regressavam normas e interditos, a merenda na sala de estar que agradasse à sobrinha e compinchas - leite com canela, limonada e o mais antes descrito. Com desgosto, a catraia ficava só. No baloiço dependurado na nogueira do jardim traseiro, alma cheia, lia e sonhava.
Pelas sete da tarde estival, regressava à liberdade tolerante do granito dos avós. Às quintas, dia de mercado na Vila, era entregue à vigilância permissiva das empregadas. Com as meninas filhas dos trinta e dois afilhados da avó, na maioria pobres ou com remedeio pouco, trabalhadores unidos por afecto à matriarca bondosa que fazia missão de vida encaminhar para futuros risonhos quem dela dependia, a garota saltava de penedo em penedo na ribeira bordada por margens de floresta, caía e encharcava os vestidos de folhos que serviam de bóia, secava-os a caminho do forno comunitário pedindo por ‘mor de Deus’ centeio e azeitonas. As forneiras riam. Benesses concedidas por acharem graça à miúda mais rural que todas, sazonalmente arribada da cidade grande que raras conheciam. Na criança, viam espontaneidade sem porquês. Talvez razão/fundamento para afectuosas memórias e sorrisos a cada reencontro.
Chegada à glória, de braço dado com o AM, só nos deixa baralhados pela dúvida, quem fez o quê? E por outras, como sejam, se uma for 'Vista da cidade de Viseu' a outra é...
E ainda, a Teresa C. pinta? Desde quando? Expõe? Onde? Dados biográficos?
E a propósito, ou não muito?, recordemos o sucessor JAM (dos sete ofícios?)
«Em 1970, com predomínio da fotomontagem, testemunha-se a invasão dos "turistas", assim como a presença de fantasmas do nosso passado no país de opereta. Em 1971, colaborando com José Cardoso Pires, parte em «Peregrinação pelos territórios da comarca em demanda do BURRO-EM-PÉ, personagem difusa e muito local, mas difícil de apreender em razão das rebeldias e dos caprichos que oculta sob o martirizado pêlo da resignação». É uma viagem gráfico-satírica por este país de surrealismo. Deste ano são também várias experiências abstratizantes, em paródia pelo absurdo. Em 1972 o jogo humorístico, com o desenvolvimento da cor, da colagem, da abstracção, atinge um dos momentos mais altos da intervenção irónica que, apesar de menos incisiva que outros trabalhos anteriores e posteriores, o leva ao confronto com a lei. Em causa esteve o "poster" Festival, onde havia uma utilização da bandeira para o humor, e que foi publicado a 11 de Novembro de 1972. Dois dias depois o desenho foi denunciado pelo jornal "Época", o órgão da A.N.P., levantando-se consequentemente um processo-crime.»
Veneno C. - os nomes respeitam a ordem das pinturas. A do Abel Manta não representa Viseu, mas cidade outras, na altura, vila. A Teresa C. pinta, sim. Nunca pretendeu expor, porque ruudimentar, o que lhe sai da alma transportada para os pincéis.
O vídeo que consta das 'tags' e refere era o primeiro incluído no café da manhã. Retirei-o pela conversa no final. Agora, substituí por outro em que a maravilhosa voz da Isabel Silvestre está só.