Sexta-feira, 22 de Julho de 2011

DOS LUTOS, O CELEBRAR

Fabian Perez

 

Ao almoço de amigas, faltaram duas, também pertença do núcleo duro que, há décadas, formavam. Idades próximas. Eram quatro a fruir do encontro. Adiaram os pedidos, debicaram entradas originais ou não fosse o dono um gastrónomo exigente – da cozinha tradicional  portuguesa, colhia ideias para culinária de fusão. Enquanto comiscavam, a conversa fluía. No início, alegre partilha de novidades, muitas da família e todas próprias de quem há algum tempo não se via. Depois, notícias familiares ora boas traduzidas em imagens felizes, ora preocupantes se a saúde periclitava.

 

Da Mariana ouviram o choque sentido ao saber a mãe com Alzheimer. Havia suspeita pelos indícios do comportamento, mas, no momento em que o neurologista, discretamente não fosse a mãe entender, estabeleceu o diagnóstico, fugiu-lhe o chão. Manteve a compostura por razão idêntica à do especialista, acrescida de amor e sofrimento indizível. Contou a dor, o reagir trémulo, a incapacidade de afastar do cérebro o repetido pensar no estado de quem a dera para a luz.

 

A Isabel deu conta do idêntico mal da mãe. Desolador o quadro que ela acompanhava momento a momento. Sendo Alzheimer doença que, felizmente, não causa sofrimento ao doente, mas sim a quem, de perto, assiste à progressão, a Isabel deixara de ter um instante disponível para ela, fosse dia, fosse noite. Devagar, aceitara o desmoronar psíquico da mulher outrora diligente, sensata, dedicada à família sempre. Internada, havia uma semana, no hospital por maleita outra não diagnosticada. Mais do íntimo descreveu a Isabel: o sentir-se em falta ao arredar o pé do quarto, a necessidade de acompanhar a mãe e entender-lhe o possível.  

 

Ontem, morreu a Dona Vitória. O negrume cobriu família e as seis amigas que privaram com a senhora anos a fio. Fazer o luto das lembranças da mulher por todas gostada, é quebra dum ciclo. Algumas partidas experimentaram aquelas mulheres - nunca o hábito se instala, nunca as almas deixam de sangrar, conquanto o tempo suavize o esvair. E se qualquer luto é penoso, seja pelo divórcio ou por um tempo sem regresso, nenhum é comparado aos que transformam em anjos pais, filhos e companheiros.

 

Mas novo almoço ficou marcado. Há que celebrar as benesses dos que ficam, desfiar memórias que honram esta partida, o tempo de viver.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 11:35
link | Veneno ou Açúcar? | favorito
7 comentários:
De c a 23 de Julho de 2011
como não sabia de que fusão se cozinhava... aproveitei para degustar ;-)

«Tomando um tinto português satisfatório c/ um queijinho gorgonzola e azeite, tentando não me lembrar que segunda-feira eu volto a trabalhar»

fms
De Maria Brojo a 26 de Julho de 2011
C. - não cozinha, congemina-se, prepara-se e é servida.
De c a 1 de Agosto de 2011
então, sendo culinária a arte de cozinhar, diria gastronomia (conhecimento relativo ao arranjo das refeições, a arte de saborear e apreciar as iguarias).

mais receitas

http://myguide.iol.pt/xn/detail/4971388:Event:67203?xg_source=activity

Comentar post

últ. comentários

Olá. Posso falar consigo sobre a sua tia Irmã Mar...
Olá Tudo bem?Faço votos JS
Vim aqui só pra comentar que o cara da imagem pare...
Olá Teresa: Fico contente com a tua correção "frei...
jotaeme desculpa a correcção, mas o rei freirático...
Lembrai os filhos do FUHRER, QUE NASCIAM NOS COLEG...
Esta narrativa, de contornos reais ou ficionais, t...
Olá!Como vai?Já passaram uns meses... sem saber de...
continuo a espera de voltar a ler-te
decidi ontem voltar a ser blogger, decidi voltar a...

Julho 2015

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

pesquisa

links

arquivos

tags

todas as tags

subscrever feeds