Sexta-feira, 19 de Agosto de 2011

À SOMBRA DA “CARVALHA”

Emma Srncova

 

“Carvalha” designam os nados em Aldeias o carvalho de idade por datar. Velho, muito velho é porque respeitado pelas muitas e sucessivas gerações que desde sempre lembram o tronco ancho e a sombra majestosa na parte de cima do adro da igreja. O lugar de culto tem que se lhe diga pelo requinte e antiguidade de algumas imagens, pelos retábulos em fundo que as destacam, pelos baixos-relevos cobertos por ouro em película fina, que, à tardinha ou acesa a iluminação, emprestam brilho doce ao silêncio do espaço. 

 

Abrigados pela “carvalha” – de facto, carvalho-alvarinho – muitos recém-baptizados e casais de nubentes se fizeram fotografar: pais, irmãos e padrinhos em primeiro plano, convidados distribuídos na escadaria/cascata. Todos engalanados a preceito, ansiosos por seguirem para a boda em casa da noiva ou desta familiar; sendo muitos os convivas, na sala ampla da “Associação Cultural e Recreativa”. Canja de galinha na véspera sacrificada com outras, pratos de carne, constituíam os «quentes»; nos «frios», fatias de chouriços secos ao fumeiro e confeccionados quando da matança do porco, de presunto curado nas salgadeiras, “queijo da serra”. Arroz-doce, leite-creme queimado, pudins de ovos, biscoitos e «esquecidos», bolo de noiva como remate. Um fartote bem regado com vinho da região. “Porto” e licores no final – o espumante faria parte dos «bebes» aproximados os setenta. E a festa continuava tarde fora, até os noivos julgarem adequada fuga que lhes permitisse o “enfim sós!”

 

Confeccionado pela noiva desde a alvorada da juventude – casar e procriar era destino da mulher - o enxoval contemplava lençóis às dúzias, atoalhados, napperons, combinações e camisas de dormir enfeitadas com bordados, nervuras, finas rendas intercaladas, se para tanto chegassem os haveres paternos. A quantidade e qualidade dos panos de lençol, das toalhas de mesa, em linho puro era dobrado o valor, bem como a riqueza dos lavores, permitiam avaliar enxovais e as «prendas» da noiva. Corria notícia dos mais impressivos, da beleza do vestido branco subido ao altar, da fartura na boda paga pelos pais da futura ‘esposa’. A lembrança das mulheres de algumas gerações reteve o da menina Maria do Céu Oliveira Canhoto que em Lisboa comprara panos, fitas, cetins do melhor, pelas mãos delicadas da jovem tornadas obras de arte. Os pais do noivo mobilavam a casa do jovem par que a Santa Madre Igreja abençoara, primeiro, nos dizeres latinos, após o Concílio Vaticano II, em escorreito português.

 

As progressivas modificações introduzidas pelo maior momento de renovação da Igreja Católica, o referido concílio cujas vertentes essenciais eram a liturgia e a participação dos leigos, nem sempre colheram louvores dos crentes. Por esse tempo, era o tio-avô Alberto, pároco das Aldeias. Recebeu encomenda peculiar dum pai de família:

_ “Venho cá pra o Senhor Abade rezar missa por alma do meu pai, que a gente entenda e de «cu» pra baixo.”

Numa assentada, dizia não à missa em latim e à novidade do sacerdote com altar pela frente, encarando os fiéis.

 

Mas a “carvalha”, testemunha de «viveres», desgraças e graças, teima no porte assombroso, na abóbada de folhagem e desmente: _ “Carvalho que dás bolota não dás coisa boa, cada um dá o que tem conforme a sua pessoa.”

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 09:16
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5 comentários:
De c a 19 de Agosto de 2011
c fica feliz e vai voltar, pois o Pedro deve saber desta versão humanizada.
De c a 19 de Agosto de 2011
conforme prometido

As árvores como os livros têm folhas
e margens lisas ou recortadas,
e capas (isto é copas) e capítulos
de flores e letras de oiro nas lombadas.

E são histórias de reis, histórias de fadas,
as mais fantásticas aventuras,
que se podem ler nas suas páginas,
no pecíolo, no limbo, nas nervuras.

As florestas são imensas bibliotecas,
e até há florestas especializadas,
com faias, bétulas e um letreiro
a dizer: «Floresta das zonas temperadas».

É evidente que não podes plantar
no teu quarto, plátanos ou azinheiras.
Para começar a construir uma biblioteca,
basta um vaso de sardinheiras.

—Jorge Sousa Braga

in http://www.arvoresdeportugal.net/2009/10/as-arvores-e-os-livros/

passado, presente sem futuro

http://sombra-verde.blogspot.com/2011/08/passado-e-presente-sem-futuro.html
De Maria Brojo a 23 de Agosto de 2011
C. - não conhecia o poema nem o blogue. O primeiro comoveu-me, o segundo é muito, mesmo muito bom para o meu gostar.
De Cao a 20 de Agosto de 2011
Of mice oaks and olive trees....
Antonio Machado (1875-1939)
Antonio Machado

Los olivos

I
¡Viejos olivos sedientos
bajo el claro sol del día,
olivares polvorientos
del campo de Andalucía!
¡El campo andaluz, peinado
por el sol canicular,
de loma en loma rayado
de olivar y de olivar!
Son las tierras
soleadas,
anchas lomas,
lueñes sierras
de olivares recamadas.
Mil senderos. Con sus machos,
abrumados de capachos,
van gañanes y arrieros.
¡De la venta del camino
a la puerta, soplan vino
trabucaires bandoleros!
¡Olivares y olivares
de loma en loma prendidos
cual bordados alamares!
¡Olivares coloridos
de una tarde anaranjada;
olivares rebruñidos
bajo la luna argentada!
¡Olivares centellados
en las tardes cenicientas,
bajo los cielos preñados
de tormentas!...
Olivares, Dios os dé
los eneros
de aguaceros,
los agostos de agua al pie,
los vientos primaverales,
vuestras flores racimadas;
y las lluvias otoñales
vuestras olivas moradas.
Olivar, por cien caminos,
tus olivitas irán
caminando a cien molinos.
Ya darán
trabajo en las alquerías
a gañanes y braceros,
¡oh buenas frentes sombrías
bajo los anchos sombreros!...
¡Olivar y olivareros,
bosque y raza,
campo y plaza
de los fieles al terruño
y al arado y al molino,
de los que muestran el puño
al destino,
los benditos labradores,
los bandidos caballeros,
los señores
devotos y matuteros!...
¡Ciudades y caseríos
en la margen de los ríos,
en los pliegues de la sierra!...
¡Venga Dios a los hogares
y a las almas de esta tierra
de olivares y olivares!
De Maria Brojo a 23 de Agosto de 2011
Cão - de novo, a minha ignorância: desconhecia este poema. Quanto às oliveiras, o amor que lhes tenho pede-me escrito dedicado.

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