É dia de Santa Cecília cuja história edificante é contada aqui. Que me perdoem os múltiplos altares dedicados à exemplar mulher, mas para mim é dia de santa oficina, de madrugada à custa dela, de espelho retrovisor, de santo mecânico que me devolverá, completa, a viatura. Tanto adiei para hoje à custa da paragem forçada, que o tempo, desfiado como rosário, não dá para mais - as andanças programadas não se compatibilizam com táxis pela distância envolvida na área da ‘Grande Lisboa’.
E lembro momentos que me apagam lamúrias tão ociosas como as de cima.
Um homem, uma tarde de arranjos caseiros. Entre o tilintar das ferramentas e o zumbido das brocas, deslizou a fala. Económica. Pelo meio do trabalho, propus uma pausa. No ruído, na tarefa, na tarde. Aceitou um café. O sol entrava a rodos e subia à janela o odor da terra grávida.
Cereja após cereja que as palavras sempre são, chegámos à mais carnuda: felicidade. Disse com o olhar perdido na colina relvada.
_ Sou feliz!
O meu silêncio encorajou-o.
_ Não tenho o que desejo, mas gosto do que tenho.
Esboçou um sorriso como se o aroma do café e os afagos do sol lhe sussurrassem o «abracadabra» de um reduto íntimo.
Perguntam alguns de que é feita a felicidade dos 'simples'. _ De análoga massa lêveda à dos demais, por muitos complicada na metafísica de oníricas beatitudes. Distantes do real. Não reconhecendo a felicidade, sem, contudo, legitimarem o estatuto de infelizes. Peregrinos distraídos dos mosteiros e santuários da caminhada.
Aquele homem conhecia a serenidade. Genuína. Encostei-me ao parapeito, omiti a cacofonia e senti no meu o pulsar da Terra. Feliz.
o 'meu' Vasil fica aqui valorizado com grande eloquência, evitando que indague qual grávida terra e qual dela o pulsar e leva-me a propor que seja obliterada a cacofonia ociosa e supérflua, estando a eufonia ali presente e subentendida
uma verdadeira felicidade dos simples
A felicidade é como a gota De orvalho numa pétala de flor Brilha tranquila Depois de leve oscila E cai como uma lágrima de amor
A felicidade do pobre parece A grande ilusão do carnaval A gente trabalha o ano inteiro Por um momento de sonho Pra fazer a fantasia De rei ou de pirata ou jardineira Pra tudo se acabar na quarta feira
Tristeza não tem fim Felicidade sim
A felicidade é como a pluma Que o vento vai levando pelo ar Voa tão leve Mas tem a vida breve Precisa que haja vento sem parar
A minha felicidade está sonhando Nos olhos da minha namorada É como esta noite Passando, passando Em busca da madrugada Falem baixo, por favor Prá que ela acorde alegre como o dia Oferecendo beijos de amor
Atão o " simples" já tinha comido um pratito de sopa? E se um dia faltasse a sopinha à menina também era simples? Parafraseando o outro Manuel da Fonseca) a verdade é um prato de sopa.Eu gosto das suas croniquetas. Agora diga-me lá: como é que consegue escrevinhar estas "stories "todos os dias ? Arre ,livra.....
Dos do leste a minha simpatia vai mais para os búlgaros e não é por terem tentado matar o papa...
http://youtu.be/fBd8qpi9lz8
E como perto está a quadra e doutro simples (dos verdadeiros) Aqui vai
De Cão da Estrela da Manhã a 22 de Novembro de 2011
De Manuel Bandeira e por mim dedicada aos simples. (seja lá isso o que seja).....
A Estrela da Manhã
Eu quero a estrela da manhã Onde está a estrela da manhã? Meus amigos meus inimigos Procurem a estrela da manhã
Ela desapareceu ia nua Desapareceu com quem? Procurem por toda a parte
Digam que sou um homem sem orgulho Um homem que aceita tudo Que me importa? Eu quero a estrela da manhã
Três dias e três noites Fui assassino e suicida Ladrão, pulha, falsário
Virgem mal-sexuada Atribuladora dos aflitos Girafa de duas cabeças Pecai por todos pecai com todos
Pecai com os malandros Pecai com os sargentos Pecai com os fuzileiros navais Pecai de todas as maneiras
Com os gregos e com os troianos Com o padre e com o sacristão Com o leproso de Pouso Alto
Depois comigo
Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples Que tu desfalecerás Procurem por toda parte Pura ou degradada até a última baixeza eu quero a estrela da manhã