John Stone
Local
- supermercado de bairro.
Protagonistas
- a Macy, o dono do supermercado, a cigana, a mulher nervosa.
Na caixa junto à porta, a Macy queixava-se do frio. «Encamisolada» até mais não poder. Rosto franzido. Contrariado. De resto, é quase sempre assim
independentemente da estação do ano. Chama “meu amorrr” às clientes. É brasileira com anos de Portugal. Cinco, enumero. Dos anteriores nada sei. Dedos ágeis fazem sair, num ápice, a conta/paga. Rabuja, mas enfia à medida que tecla os adquiridos num saco. Encara as filas de clientes como prova de mau gosto pela hora escolhida.
Cenário restante – expositores, congelados no frio em arca vertical com a porta transparente para estimular apetite. Rondam-nas compradores. O dono, mal-encarado, vigia funcionárias e quem se apresenta disponível para encher o fundo do saco de plástico num irritante amarelo. Etnias misturadas atraem no lugar.
De novo, a caixa registadora. A cigana substituía a Macy no gesto «enche-saco». Totalizada a conta, sopesa conteúdo e euros. Da bonomia faz uso: _ “esta é a casa da desgracia”. E gargalha enquanto o diz. A “senhora dona” atrás e à minha frente resolve também ensacar. Chegado o momento de abrir o porta-moedas, fosse pelo nervosismo acidental ou costumado, derrama no chão as moedas. Ninguém da fila se mexe, salvo eu. De cócoras, cato as que vislumbro e entrego-as à dona. Deparo-me com ela ao alto, esperando a minha recolha. No gesto da devolução, ouço:
_ Nem valia a pena. Acordei a saber que iria perder dinheiro.
_ Mas não perdeu. Julgo estarem aí todas.
A Macy concordou. Os da fila também. Continua a senhora dona crente em predestinações:
_ Não! Que perderia dinheiro sabia desde manhã.
E saiu cabisbaixa sem palavra mais ou olhar para trás.
CAFÉ DA TARDE
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros