Michele Del Campo
Mil milhões de pessoas com fome. Um sexto da população do mundo. Ouvido semelhante a isto: “é impossível preocuparmo-nos com todos: por tantos serem ficam invisíveis. Individualmente não é possível ajudar o conjunto. Mas podemos auxiliar um. Escolhamos esse. Porventura habita ao lado. Façamos dele, causa. A dispersão arruína a solidariedade.” Mistura do escutado e o ‘digo eu’.
Recado que parece fácil: “Olha à volta e encontras.” E volvi ao olhar que uso. De novo, absorvi imagens pobres de fatia importante das gentes do meu bairro. No minimercado, a um quarteirão distante, mãe obrigava petiz a repor na prateleira desejos simples que não podia pagar. De soslaio, eu escolhia fruta escandalosa no tamanho e preço.
Indecisões:
- ofereço-me para custear os desejos da criança e comporto-me como escuteira que cumpre a boa ação do dia?
- Até que ponto avilto o orgulho e a autoridade da mãe?
- Simulo não ter prestado conta ao porta-moedas vazio ao lado?
- Indago ao vendedor, que os conhecia, onde moram e ultrapasso a intimidade legítima?
- Vou para casa servir figos num jantar de afetos primordiais e passo esponja na imagem? Ou lembro e sublimo?
“Feios, Porcos e Maus” é filme e «pré-conceito». Onde cabe e como lidar com a vontade de ir além no mais fazer por quem precisa e vive próximo? Foi ontem o acontecido. Resposta por encontrar. Mas servi e comi figos. Enormes. Suculentos. Doces. Agravei o incómodo na minha consciência social já antes esburacada.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros