Sem Pénis Nem Inveja

Mark Harrison

Existem aqueles que dos hábitos constituem altares cultuados. Em cada dia, prostram no genuflexório as dobradiças. Acendem velas. Queimam incensos em louvor do deus/uso. Talvez forma de autismo social. De auto-defesa num tempo massificador e agressivo para a diferença. O bullying evoluiu: está presente em todas as idades; no estado adulto, a incidência aumenta com o poder económico e social. 

Entendo os refugiados voluntários nas suas vidas e manias; porém, o quotidiano vareja-os até saírem da toca. Acabam por espreitar a corporativa onde se reúnem os pares. Por dar um pé de dança na respectiva ‘Associação de Recreio’, uma entre as mapeadas pelo Google Hearth. Quando a Rosália arrulhar com o Helder, julgando-se oculta na sombra da esquina, os satélites triangulados captam. Eficiências GPS esquecidas na quentura do momento pela dupla enamorada/entesoada _ a distinção sensível entre estas opções é enguia manhosa ao entendimento. Sempre assim foi e será na história das gentes, ainda que milhares de anos desfasadas das vigiadas/localizadas por testemunhas materiais no hoje celeste.

Viver num mundo ‘chipado’ por cartões made com polímeros, vias verdes, móveis tele, sugere-me indiferença: piores os sentidos arregalados e temíveis da D. Rosa, porteira do vendido T3 na popular Benfica. O sítio e o T e a D. Rosa eram insuportáveis. Há dezasseis anos, aconteceu fuga. Não foi promoção alterar residência para villa vasculhada por câmaras. Julgados piores que a D. Rosa _ registam o “sobe a saia e mete dentro a camisa até ao elevador”. A idiota julgava detectando fumos os tumores no tecto falso. Até um dia. Até ver na cabina/segurança painéis coloridos numerados por andares. Olhares fixos neles.

Passou a sair imperturbável. Reconquistou a displicência dos «olheiros». Dentro do elevador à prova de vídeo, faz o mesmo que antes. Fosse a D. Rosa, apanhava-a entre o quinto e o zero. Vantagem dos 'paineleiros': não encostam o ouvido à porta e nada sabem dos tapetes gemidos.

CAFÉ DA MANHÃ