L. M., bom amigo, propunha-se ler, calmamente, a revista do semanário, refastelado no altar da «casinha». A meio do alívio, abonou-se de papel, largado, após, na cova do altar. Continuada a leitura enquanto mais não chegava, ao desfolhar o papel, fez golpe no dedo. Hipocondríaco, alcançou álcool e algodão, não entrasse “microbicharada” na ferida, talvez infectando, depois, causa duma septicemia mortal. Tratado o golpe, o algodão fez companhia do papel e aos despojos. Aceso um cigarro, continuou a leitura. Lançou a beata para a cova. Deu pela coisa quando traseiro e apêndices passaram de quentinhos a pasto de chama. Levanta-se de supetão agarrado ao essencial, desequilibra-se, bate com o cocuruto na esquina da bancada. INEM, hospital, pudendas queimadas e cabeça rachada. The End.
Livre-arbítrio: “possibilidade de decidir, escolher em função da própria vontade, isenta de qualquer condicionamento, motivo ou causa determinante.” Agimos isentos de condicionantes? Determinismo ou liberdade nas escolhas? Neste particular, há muito que a Filosofia anda às turras. Facto é as sociedades resultarem do passado, do presente, de cada um e todos se defrontarem com os resultados das acções.
Defuntos e vivos são culpados da miséria, desemprego, violência. Esta realidade permite a milhões o livre-arbítrio? Por tudo ganha terreno a concepção determinista: todos os acontecimentos resultam de circunstâncias anteriores. Mas não foi o L.M. que decidiu desinfectar a ferida? E fumar? E ler o jornal na «casinha»? Porém, existiu mando interior que não envolveu decidir. É hipocondríaco sem ter escolhido a mania num amanhecer rezingão.
Neste tempo, vinga o “livre-arbítrio compatibilista” (paridade do determinismo com a liberdade de escolhas). E trago uma estória de Voltaire sobre o passarinhar no mundo de um sujeito chamado Cândido incapaz de optar.
Cágada - Se tirar o acento... fica isso. Com o assento, em vez do acento, fica nisso. Uma. Uma? Outra. Essa! (http://www.youtube.com/watch?v=76zoCHcVz2w&has_verified=1)
O Cândido é de 1759... que anda ele aqui a fazer? Incapaz de optar? Como assim?
Ridendo Castigat Mores
««“Cândido” é uma das obras mais conhecidas de Voltaire. O texto contrapõe ingenuidade e esperteza, desprendimento e ganância, caridade e egoísmo, delicadeza e violência, amor e ódio. Tudo isso mesclado com discussões filosóficas sobre causas e efeitos, razão suficiente, ética. Como sempre Voltaire expõe suas concepções com fina ironia, sem abandonar o sarcasmo de quando em vez. O romance, em todos e cada um dos seus parágrafos, caracteriza-se como uma sátira às idéias de Leibnitz. Leibnitz afirmara, pelo menos assim entendeu Voltaire, que o mundo é o melhor possível, que Deus não poderia ter construído outro e que tudo corria às mil maravilhas. Voltaire não podia partilhar dessa mesma visão otimista, suas idéias tinham resultado em prisões e perseguições a tal ponto que, por volta de 1753, já não podia fixar-se, sem risco, em lugar algum da Europa. Cândido foi expulso de onde morava, foi preso e torturado, perdeu sua amada, seus melhores amigos; em todos os casos com requintes de crueldade. Mas a cada um desses fatos, meditava sobre como explicar o melhor dos mundos possíveis, sempre com deboche mais ou menos sutil. Como é peculiar a todos os seus trabalhos,o filósofo também criticou acidamente os costumes, a cultura, as artes. Sobre as relações entre sexos, uma passagem merece ser mencionada:
“Um dia, em que passeava nas proximidades do castelo, pelo pequeno bosque a que chamavam parque, Cunegundes viu entre as moitas o doutor Pangloss que estava dando uma lição de física experimental à camareira de sua mãe, moreninha muito bonita e dócil. .../... »»
o resto... (http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/candido.html)
Esta história cheira -inevitavelmente-mal mas produz reflexão rica. Pode continuar e dou-lh'um livro para as férias e outro no natal se tirar dali o inútil, desgraçado, disconforme e deselegante palavreado americano
em sede (fica a ambiguidade!) comemorativa, trago e voto à Taça ibérica, ao Cândido e a Silva Palmeira, tudo em boa hora oferecido Sem Inveja!!
ah... e, permitido excesso, trago (mais fica) outro aos autos: o paradoxo do burro, bebido em Aristóteles, explicando que por indecisão se pode morrer de fome e/ou de sede perante alimento e água!!!
ps - para a eventualidade de interessar ilustração musical: http://www.youtube.com/watch?v=lteP780mTcE
A chave do jogo escondido frontalmente (http://www.pnetartes.pt/obra.asp?id=MTk3XzEx)
Cândido? nem por isso... (http://www.youtube.com/watch?v=0gPW4UuMHJs)
Taça Ibérica? Até na água... (http://www.youtube.com/watch?v=pctH74TXuik)
Ditos por cá: A preguiça morreu de sede à beira da água... A pensar morreu um burro... (via Net "Já a angústia tem como causa a divisão. É a história do Burro de Buridano, que após a atravessar o deserto chegou a um oásis, cansado e morto de fome e sede. Parou exatamente na metade da distância entre a comida e a bebida. Não podia comer porque tinha sede e não podia beber porque tinha fome. E de pensar morreu o burro.")
A última, mas não menos importante:
"E entretanto o tempo fez cinza da brasa e outra maré cheia virá da maré vazia nasce um novo dia e no braço outra asa brinda-se aos amores com o vinho da casa e vem-nos à memória uma frase batida hoje é o primeiro dia do resto da tua vida."