A criminalidade portuguesa é sazonal. No tempo de Outono e Inverno, carteiristas, assaltantes convenientemente apetrechados com armas de fogo ou lâminas cortantes, violadores, agressores domésticos, entusiasticamente, retomam funções. Dias pequenos e cinzentos, desemprego, mais tempo entre paredes gastas, o tédio doméstico, ausência de educação do gosto ou condições para um concerto ou uma exposição, propiciam conjugações delinquentes. No bairro, os cafés e as esquinas acoitam vendedores de químicos proibidos e más intenções. As tertúlias duram e continuam após o sol-posto. Cozinhados de Misters Ripley à portuguesa. Como os personagens de Patricia Highsmith sem punição oficial condizente.
No Estio, amainam as especialidades delinquentes da época fria do pousio nos solos. A saison é inaugurada por incendiários deliberados ou ocasionais. Não merecendo a classificação de crime, o ‘espreita’ dos voyeurs entra em alta. Binóculos assestados, ocultos pelas dunas, fazem zoom à lascívia que adivinham nos areais. Valem os chorões que lhes dificultam o rastejar do corpo e do espírito. Porém, cedo terão percurso mais desimpedido. Tratadores da natureza declaram os suculentos chorões praga a combater, a sacar pela raiz, porque glutões dos nutrientes das espécies que salvaguardam a estabilidade das dunas litorais. Planta invasora e também criminosa, exportada do Cabo, África do Sul. Triste fim para um verde que dá flores mimosas e colorido à beira-mar. O pecado da gula raro ou nunca acaba bem.
«Patricia Highsmith é a grande criadora do romance policial psicológico e Tom Ripley é o personagem de referência da sua obra, um dos mais "negros" do policial do pós-guerra, "um homem que não reconhece a culpa em qualquer circunstância", segundo as palavras da escritora. Por isso ela lhe dedicou toda uma série de livros, que começa justamente com "O Talentoso Mr. Ripley" , mais uma vez adaptado ao cinema, agora pela câmara de Anthony Minghella. Aliás, a obra da autora desde cedo apaixonou os cineastas. O seu primeiro romance, "O Desconhecido do Norte-Expresso seria adaptado por Alfred Hitchcock. Outros se lhe seguiram, fascinados por Ripley: René Clement e Wim Wenders. Ripley é um homem vulgar, que quer sair da América. A oportunidade surge quando o Sr. Greenleaf, seduzido por uma sua prestação ao piano, enganado por um casaco da Universidade de Harvard (Ripley é muito bom a imitar, a manipular, a disfarçar), o convence a ir à Europa e trazer-lhe de volta o filho, que vive em Itália uma dolce vita, com a mesada que o pai lhe manda todos os meses. Ripley torna-se amigo de Dickie Greenleaf e da namorada deste, mas numa discussão violenta acaba por matá-lo e assumir a sua identidade. E a partir deste momento, o perigo, o inesperado, o medo, mas também uma frieza e um calculismo extremos perante a morte, passam a fazer parte do quotidiano de Ripley, que, no entanto, é capaz de se comover e nos comover, ao assistir a um espectáculo de ópera.»
Cavadelas tendem a continuar em altos voos ... (http://www.youtube.com/watch?v=pG5dzybHgTo)