Viver não custa, acordar sim. Difícil é abandonar a moleza, impor ordem aos músculos e a cada osso ou ossinho. Ordenado o cérebro para o dia pensante e de acção, assumir a vertical. Iniciar o dia consciente. Ter asilo nos rituais - debruço na janela para espertar os sentidos e receber, de chofre, a luz inteira, abrir o frigorífico, ligar a máquina do café, conferir ao «pequenino-almoço» a frugalidade, uma outra impressão digital da personalidade.
Aconchegado o corpo na cadeira, bebericar leite e pensamentos e, do dia, o prazer a construir. Porque a alegria se ergue como edifício no amanhecer seguinte recomeçado, assim haja pré-disposição ou vontade, com ela fruir dos instantes, esmaecer problemas para, depois, os perspectivar doutro modo.
Negar semelhança ao peru que sempre morre de véspera, rejeitar negrumes quando, haja optimismo, inventar luz é fácil, poupa o ser de mágoas antecipadas. Confere-lhe competências: distância de precipitações, análise crítica, disponibilidade para ouvir e recolher o melhor, para atender os outros com o tempo ganho na recusa da auto-comiseração. E fica mais leve o espírito e o corpo por vida dele. Nascem risos. Nascem rugas com eles. Mas antes registos na face com boa causa na origem do que outros, tão inevitáveis como os anteriores, que engelham e torcem, duma vez só, o corpo todo.
Pirata-Vermelho - teimar na cruzada contra borrascas que o não são, ou, sendo, que mesmo no desalento, haja pulo e o ir adiante.
Crítica possível: na diversidade dos seres qualquer receita contra a tristeza e depressão é ociosa. Falar do próprio umbigo e das generalizações, a partir dele, feitas é fala muda sem quê nem para quê.
Ador(n)ável esta Gal, no penteado não frugal, não fica aqui nada mal...
Mas a reflexão incompleta (falta o princípio e o fim), qual Vénus mutilada, deixa liberdade de conjecturar sobre a entrada do peru em cena. Até porque há outros sinais que induzem suspeitas tais, quase fatais.
Posto (e suposto) o exposto, com todo o gosto, ataquemos não o principal, antes o frugal. É que a frugalidade deverá ser mais de quem come e menos de quem é comido, ou não?
«Na mesa , era de uma elegância frugal que desmentia a procedência. Olhava para o bife com fastio tal e tamanha tristeza, que fazia lembrar Tertuliano, quando. meditando na metempsicose (transmigração), olhava para o boi cozido e dizia: "Estarei eu comendo meu avô" ?» (Camilo Castelo Branco)
Anónimo - a 'frugalidade' do desjejum, a gula dos sentires. E, permita-me, discordo: - existe princípio e fim na crónica. Outros começos e finais cabem a cada um.