Por razões profissionais e voluntárias, veio recambiada para Lisboa. Aluguer de casa, mudança dos púcaros e tarecos, novo ambiente de trabalho. Cidade por dominar nos atalhos e desvios e nos caminhos d’alcatrão que dum lugar levam a outro. Treina percursos, acabada jornada de trabalho. Filha pequena a 300km de distância por ter iniciado actividades lectivas ainda a mãe não mudara do ninho quente que às duas comprazia. Uma vez por mês, está com a sua menina na cidade donde veio, custos descontados no parco vencimento de licenciada com pós-graduações no cume das ondas científicas; na outra é o pai, ex-marido, que lha traz. A renda paga ao senhorio pela casa digna que de Janeiro em diante, acabado o primeiro período escolar, alojará mãe e filha. Do pré, leva a maior fatia. Descompensada afectivamente pela ausência da criança prolongamento do útero e amor maior. Ouve-a ao telefone. Umas vezes chora, raramente espraia no rosto sorriso - apavora-a perder o cordão que unia ambas.
Procura escola para a filha. Sobreviver capital na capital. Compatibilizar horário de trabalho com o cuidado de estar na escola a tempo e horas para a menina não sentir esperas de falso abandono. Mulher só na moura urbe. Sem rede de apoio familiar. E quando vierem febres infantis? Faltar pode, mas não deve sob pena de danos profissionais que à pequena família acrescente reveses. Quotidiano difícil para mães e pais isolados com filhos a cargo. Famílias monoparentais, classificação useira. Nelas, o império do ‘tem que ser’ substitui escolhas. Valem, como âncora, afectos - «novam» e renovam o brilho dos dias.
Quase poético: 'nos caminhos d’alcatrão que dum lugar levam a outro'. Ou seja, as banais ruas.
Mas este levam irritaria um vulgar alentejano que, não sendo muito dado a poesias... reagiria com grosseria à inspirada musa, invocando cena que levaria a sítios menos polidos ;-)
O ninho quente também é quase poético... a menos que estivesse um calor danado ou fosse básico de canídeo rafeiro?
Mais que poético: com pós-graduações no cume das ondas científicas. Há um famoso poema que trata de todos os cumes... mas não chegou a este nível ;-)
Nada poético, até Janeiro: só está com a filha duas vezes por mês (duas em Novembro e duas em Dezembro).
Surrealismo? Criança prolongamento do útero :-(
Melhor fazer seguro: apavora-a perder o cordão...
Grande frase: sobreviver capital na capital (tenho pena de não ter pena - resta-me teclar).
Castigo dos deuses: para a menina não sofrer esperas de falso abandono :-(
Impossível: mulher só na moura urbe (será Lisboa?)
Violações gramaticais:
revezes (ê)
s. f. pl. Us. na locução adv. a revezes, cada um por sua vez; ora um ora outro.
useiro (uso + -eiro)
adj. Que costuma fazer alguma coisa. ser useiro e vezeiro: fazer muitas vezes alguma coisa, geralmente censurável. (é o caso!)
Salvação última: os afectos. Renovam o brilho dos dias. Quando há sol. Não das noites.
Valeu. A pena. Não tenho. Alguém tem. Não desdenho a cena mas o texto. E o título: não há qualquer império. Im(pro)pério? Apetece. E o 'tem que ser' tem muita força: é a vida? Alternadamente, sim, às vezes não.
Confesso que não quis ter graça na dupla desgraça, do texto e da mãe pós-graduada. Terá sido um sentimento de repulsa pela desapropriada atitude de ilustrar um texto com um ficcionado drama a puxar ao 'coitadinha', ficando tudo assim... como estava?
E voltei para admitir um possível contágio do Catita, desmontando a realidade, como que 'trincando o pastel para o sentir desfolhar'? Um alerta para admitir que há coisas que melhor seria deixar estar, respeitando a sua intimidade.