Deborah Poynton Kemp
Há ruído na comunicação entre homens e mulheres. Eles acusam-nos de até aos alhos pintarmos mil bugalhos. Dos molhos de pormenores até chegarmos aos factos. Soando o gongo para escutarem uma mulher, ajeitam-se no assento, acendem um cigarro e aguardam os preliminares. Jaz a beata no cinzeiro, engoliram o café e ainda descrevemos a moldura da substância. Trocam a perna traçada e, com vaga esperança de sucesso, interrompem para dizer:
_ Dizias que foste assaltada. Quando foi isso?
E nós abespinhadas:
– Não ouviste o que contei? Pois se acabava de sair do cabeleireiro, só pode ter sido às duas da tarde, ou esqueces que meia hora depois já estou no trabalho? Aliás, a Elisa estava impossível, e do corte de cabelo que pedi, comprimento médio com as pontas que ladeiam o rosto mais compridas, assim como a Victoria Beckham, vês o que me fez? A Talita afirma que fico com ar ladino. Tu que achas?
E eles que sim, que é verdade, que estamos ótimas, mas adiante.
_ Onde foste assaltada?
_ Era o que explicava antes de interromperes. Conheces a charcutaria que fica em frente do BES? Numa corrida entrei para comprar uns mimos mais umas fatias de peru fumado. Ao pagar, o terminal automático não funcionava e eu sem dinheiro. Já eram duas e um quarto, imagina!
Torcem o pulso buscando no relógio razão para o formigueiro nas cruzes. Com voz gelada, arriscam:
_ Levantaste o que precisavas no ATM e fanaram-to depois?
_ Não me deixas falar! Antes tivesse sido... Mas não. Pior, muito pior... Na conta, nem um cêntimo restava.
Aliviando a impaciência, rematam:
_ Ah, não foste assaltada.
A injuriada levanta-se. Vira costas com fúria tão alta como a bainha da saia:
_ És insuportável! Nem digo o resto. Fica bem.
Até ao carro, vocifera:
_ Todos iguais estes estupores; cretinos, egoístas, incapazes de ouvirem uma mulher.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros