Quem a sobe, reconhece-lhe nobreza. Descaraterizada aqui e além, muitos aqui para rua que poderia ser duquesa. Tem história, raça e beleza. Gradeamentos impressivos, jardins desenhados no início do século passado, o rosa português conferem majestade à rua do meio para cima, porque é ascendente o percurso se dela o melhor for procurado.
A arquitetura arredonda varandas e conserva persianas de madeira, exibe florões talhados em calcário, troncos grossos de buganvílias por este tempo podadas. Em Abril, auge em Maio, florescem cachos carmim e rubros; ferros enrolados, outros lisos, do jardim fundo apenas revelam partes. Daí a curiosidade, a paragem, olho surpreso e crítico, o captar registos.
Linhas retas suavizadas por curvas, tons pastel na pintura do edificado, cruzar de ruas perpendiculares entre elas. Apartamentos sem garagem, quase todos, ditos andares em idos mui recuados. Por isso e pelos prédios que alojam serviços, automóveis fazem bordado metálico na rua, sujeitos a parquímetros tão zelosos como os zeladores que bloqueiam rodas. Salvam-se da vigilância apertada moradores que se descabelam para estacionar perto da casa. Viver no coração da cidade em edifício bem datado, pé-direito invejável, divisões muitas, tem frequentes contrariedades – malas e malotes, sacos do supermercado arrostados da rua, faça sol ou chuva, até recato caseiro.
Como alívio de tanta lata, retorno ao jardim afundado. Quando as rosas de espécies raras florirem, outro será o encanto. Por ora, a beleza dos verdes e das flores resistentes aos ventos, à invernia, à frialdade. Coram espaço pontificado por árvores despidas ou despertando em rebentos prometedores, ainda vestigiais.
Portas. Ferro trabalhado, metais outros em desenhos de época. Delas entram e saem moradores de todas as idades - os mais velhos por opção antiga, os mais novos por herança ou compra dispendiosa. Funcionárias domésticas, distintas pela farda ou bata, acorrem ao quiosque e compram publicações variadas para leitura refastelada dos patrões. Arrastam carrinhos ou carregam seiras donde espreitam alhos franceses, grelos, rama de nabos. Passeiam cães. Levam meninos fardados aos colégios ou às carrinhas que esperam, entupindo circulação viária.
Porta e janela encantadas. Arrojadas ao tempo da concretização, estilizadas, hoje. Vidro e branco. Pintura sem lascas. Preservada. A imaginação realiza filme onde jovens mulheres com pele de marfim, romanticamente enchapeladas, flores de tule, vestidos de organza ou de cetim, esperadas por dândis com bigode afilado, fato esticadinho e chapéu. Depois, talvez passeio na Avenida, talvez São Carlos, talvez teatro, talvez chá em casa amiga ou pública.
Recanto sombrio, fresco no Verão, espera gentes assentadas, cervejas, jogos de bisca, póquer, xadrez ou damas. Final de Inverno e vazio que apetece à fotógrafa de ocasião. Por ali fica, inventando cenários, enquanto olha gelosias fechadas.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros