Jan Davidszoon de Heem, Natureza Morta com Violino e Livros,1628
Ela, como tantas, mulher Maria. Ele, Mário. Apresentados por terceiros, como soíam dizer, perguntada a origem do conhecimento. Na verdade, fora a «rede» que os capturara num instante de arrojo – intimidade do par que recusava escâncaras do porquê, do como e do onde. Mas não ocultavam da cidade e dos passantes abraços e beijos, mãos dadas, olhares e risos que sempre denunciam amantes.
A Maria era livre de atilhos românticos ou do que deles fizessem vezes. O homem Mário estava, até à Maria, gostosamente enredado numa relação estável com anos de histórico e cumplicidade e afeto. Mergulharam fundo nos enlevos preliminares do que julgavam paixão: marcado casamento daí a seis meses. Até seria, não fora o fatum estragar o quadro florido de mimos e beijos e o mais concluído.
Figurassem contrariedades, inexistente o comodismo da Maria e do Mário, as peripécias dos adeuses vários e dos regressos em idêntica proporção, a esmo tivessem acontecido monólogos, queixas, rogos e súplicas, inteligência e astúcia, haveria história para romance de cordel. Mas não: ganhou a passividade. Em vez de um protagonista, dois, sendo que nenhum deles desempenhou o papel de infeliz herói, ganhador somente no fim. Foi-se a faca e o alguidar onde o sangue emocional seria aparado. Por tudo não acabou a história pendurada em cordéis e barbantes, com os «cordelistas» arranhando violas enquanto, empolgados, animavam o povo à cata de ‘cobres’ dos compradores.
Anos atrás, comentadora deixou registo aqui:
_ “’Romance de cordel’ não tem a ver, precisamente, com as grandes sagas que alimentam o nosso imaginário desde os tempos medievais - "Tristão e Isolda", "A morte de Artur", por exemplo? E que mais tarde, perto do século XIX, quando o romance se assumiu como uma das expressões mais adequadas de uma burguesia cada vez mais poderosa, foi "vulgarizado", e chegou aos consumidores na publicação de jornais - lembro a grande "onda" de romances de Alexandre Dumas, Victor Hugo que em Portugal foram publicadas na imprensa, já no início do século XX.
Creio que se refere à ao nosso gosto por histórias, à necessidade de acrescentarmos à nossa realidade aquele espaço «contrafatual» que permite o sonho e a subversão.”
"Romances de cordel" ou "matéria de que são feitos os sonhos?”
CAFÉ DA MANHÃ
Do pintor de hoje, Jan Davidszoon de Heem, mostra.
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