Carl Larsson (1853-1919) – “Little Red Riding Hood” (1881)
Até 24 de Abril de 1974, era amargo e doce ser menina. Não fosse uma canastra almofadada por cobertor gasto, ou berço tomado por empréstimo caridoso que no nascimento a acolhesse, corria manso o crescer. Cedo dava conta que aparências e paz familiar recomendavam à mãe e às outras matriarcas atitude subalterna e passiva descrita por Ramalho Ortigão: “Ninguém a instrue, ninguém a distrae, ninguém procura tornar-lhe a existência doce e risonha, dar-lhe o nobre orgulho de ser amada, querida, necessária no mundo para mais alguma coisa do que lavar a casa, coser a roupa e cosinhar a comida.”
Chegada a menarca, do inesperado sangue quente escorrendo nas coxas, pouco as mães explicavam. Não constavam do bom-tom que meninas de bem referissem «vergonhas femininas» nas conversas com amigas. Era tempo de relembrar a história do Capuchinho Vermelho - metáfora sobre a preservação da virgindade (tesouro e parte do dote), que associava ao despontar da sexualidade males e perigos traçados pelas manhas dos lobos-homens. E a crescença decorria vigiada pela tirania das normas sociais e familiares. Mas havia almoço em casa. Presença na chegada do liceu. Tempo de estudo. Lugar para a leitura. Conversa do pai secundada pela mãe durante o jantar. Tudo polido e bem comportado. Desenhado à mesa o futuro da menina: licenciatura e casamento branco.
O primeiro orgasmo, acaso do sono ou surpresa na vigília, a menina guardava para si. Acontecimento estranho, pressentia pouca-vergonha que murmuraria na confissão. Ato pecaminoso se provocado, como tudo que arribasse ao corpo e não fosse contemplado no rol do dizível. Castidade no despir e vestir era ensinada pelas mães - peça de roupa tirada quando outra cobrisse a pele. Na escola, aprendia bordados, tricô, costura e veniais infracções. Era tolerado experimentar frémito num beijo pela penetração da língua quente de um rapaz, sendo cumpridas duas condições: idade adequada e namoro sério aprovado pelos pais. Às escondidas, ainda assim.
As meninas cresciam envoltas em medos e riscos. Não casar era um deles - vergonha ficar para «tia». Obrigatório sangrar na noite de núpcias (…).
Nota - texto integral publicado aqui.
Pintura mural no Porto - As Paredes da Revolução, Graffiti, 1978, Mil Dias Pintura Mural no Cacém - As Paredes da Revolução Graffiti, 1978, Mil Dias
Pintura Mural em Santo António dos Cavaleiros - As Paredes da Revolução, Graffiti, 1978, Mil Dias e Pintura Mural em Lisboa, Centro de Cultura popular de Alcântara - As Paredes da Revolução, Graffiti, 1978, Mil Dias.
Pintura Mural em Lisboa - As Paredes da Revolução, graffiti, 1978, Mil Dias
Portugal Ressuscitado
(Caxias, 26 de Abril de 1974)
"Depois da fome, da guerra
da prisão e da tortura
vi abrir-se a minha terra
como um cravo de ternura.
Vi nas ruas da cidade
o coração do meu povo
gaivota da liberdade
voando num Tejo novo.
Agora o povo unido
nunca mais será vencido
nunca mais será vencido
Vi nas bocas vi nos olhos
nos braços nas mãos acesas
cravos vermelhos nos olhos
rosas livres portuguesas.
Vi as portas da prisão
abertas de par em par
vi passar a procissão
do meu país a cantar.
Agora o povo unido
nunca mais será vencido
nunca mais será vencido
Nunca mais nos curvaremos
ás armas da repressão
somos a força que temos
a pulsar no coração.
Enquanto nos mantivermos
Todos juntos lado a lado
Somos a glória de sermos
Portugal ressuscitado.
Agora o povo unido
nunca mais será vencido
nunca mais será vencido"
José Carlos Ary dos Santos
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros