Manuela Pinheiro — “Solidão em Bola de Sabão”
Frase manuscrita no reverso de uma ementa reza assim: “Casei-me com a arte; as mulheres divertem-me.” No ateliê da pintora Manuela Pinheiro, o escrito resta preso via pionés à mistura com fotografias de amigos, a maioria com nome inscrito na história recente portuguesa. O autor foi homem da cultura, falecido quando faltava um para os setenta anos - David Mourão Ferreira. Caracterizava-o o talento como poeta e a mestria na prosa. Em privado, acrescia espontaneidade, rendição aos encantos das mulheres com quem mantinha amores felizes. Depois, por ele descritos e ilustrados com o traço de Francisco Simões, à época Francisco d’Almada. Desenhos resumidos à essência de um gesto, dois talvez, remetem para a mulher fecunda pelo acentuado redondo da anca e mamilos. Inspirados na tensão erótica de amor que inaugurava.
A frase, rabiscada a esferográfica, aparenta provocação machista e leviana. Mas o desvendar último do sentido fica a roer por dentro. Com a arte, amor e compromisso para a vida; com as mulheres, fruição de laços que atam sentidos num nó cúmplice, eventualmente terno. Talvez precário. Divertido no sentido de risonho. Folguedo de quem a vida quer cheia e livre. Isenta de obrigações penosas além das inevitáveis no percurso dos humanos.
A arte é procura de (…)
CAFÉ DA MANHÃ
Don Dixon Bill Fogé
Eles levantam ouro nas caixas ATM; nós enviesamos o olho ao ler papelote do saldo cuspido pela máquina. Eles têm petróleo; nós possuímos solo exaurido e ausência de recursos. Eles cavam fossos sociais; nós do mesmo não saímos. Eles têm mulheres subservientes, outras condenadas porque na venta arrebitam os pêlos; nós, assim possamos, fugimos dos ditadores domésticos como da cruz o diabo e, à «fartazana», eriçamos, comummente, inestéticos pêlos sendo casa as narinas/ventas. Eles misturam «esgravata-céus» com adobe e tijolo sem revestimento nas habitações; nós construímos condomínios/clausuras de elite e a maioria vive em prédios roídos e na ruína. Eles cativam turismo de luxo; nós os assalariados medianos duma Europa falida. Eles compram griffes como nós adquirimos atum de lata. Eles têm hotéis de milhares de euros por noite, em que tudo sobe e desce automaticamente, quiçá os atributos enrolados na cama XXL; nós disponibilizamos aluguer de sítios com charme para ricaços e «têzeros» que os pelintras, todos quase, utilizam para ir ‘a banhos’. Eles estão cheios do muito que roda o mundo; nós de nada. Eles não viram o Papa; nós folgámos dia e meio. Eles são uns tristes, mas abanam as ancas; nós trememos dentro e fora. Eles vivem em Abu Dhabi nos Emirados Árabes Unidos; nós em aldeia abandonada na qual se transformou o país todo. Nós temos, entre outras, heranças do Saramago, da Amália, do Nadir Afonso, do Eusébio, mais a Paula Rego, o Querubim Lapa, a Manuela Pinheiro e fado e Fátima e futebol de jeito. Temos a palavra saudade, verdes a rodos, liberdade de nos exprimirmos conforme normas a passo mais apertadas, democracia carnavalesca, juntamos no mesmo palco B. B. King e Rui Veloso. Eles não.
CAFÉ DA MANHÃ
Num centro de imagiologia, entram jejuns, ansiedades, temores. Pontualidade é lema e pena – se alivia quem as máquinas esperam, sobra pouco do tempo dedicado ao despacho do “vamos a isto que se faz tarde”. Porque nas paredes obras de arte com qualidade são muitas, somente quem da máquina fotográfica faz recheio diário da mala tem o gosto de levar para casa tanto belo acumulado. É certo, as imagens recolhidas de pinturas que verniz final reveste serem feridas com o brilho do flash. Mas que importa se o testemunho satisfará, ainda assim, a necessidade estética que todos temos?
Desemboca a porta estreita do centro de imagiologia nos Restauradores. E é o belo que persiste no casario, nos ícones arquitetónicos deste lado da Baixa.
José Guimarães
Nota: apenas mencionado um autor por demais conhecido e pela inexistência de assinatura visível ou, existindo, dificuldade em identificá-la.
CAFÉ DA MANHÃ
Kathy Sharpe
Caixas brancas. Nem um carimbo à vista. Camufladas. Objectivo: escapar ao zelo dos militares que vigiam a fronteira Síria. Dentro, empilhadas, maçãs lustrosas. Vendidas depois em Damasco. Israel e a Síria ligados por frutos sob asa da Cruz Vermelha. Neste ano, previsto o transporte de dez mil toneladas.
Vender fruta é essencial para os agricultores nos Montes Golã. Sobranceiros à região nordeste de Israel, incluem o lago Tiberíades, o maior reservatório de água do Estado Judaico. Há décadas, disputados por países. Milhares de muçulmanos que neles vivem recusam a nacionalidade israelita e preservam a síria. Os drusos são os únicos habitantes de Israel isentos de serviço militar - quase certo o alvo na mira das armas.
Marianne Gasser, da delegação do CICV na Síria, a propósito deste novo elo, afirmou semelhante a isto: há alegria pelo acontecimento e interesse bilateral. Esperamos que ajude outras retomas de consciência humanitária. Familiares divorciados pela linha de demarcação é um deles.
Que as caixas brancas, em trânsito, encobrindo maçãs antecedam mais «frutos».
Nota - pela insuficiência dos produtos germinados nos solos liderados pelo Dr. Durão Barroso, um terço dos abacates consumidos pelos europeus é nado em Israel. Pimenta e tomate, a seguir. Manjerição, cebolinho e hortelã ganham em frescura aos hortícolas chegados do Egipto e de Marrocos. Dos movimentos comunais gerados pela determinação interceptada com utopia, kibutzim foram e são exemplo.
CAFÉ DA MANHÃ
Inch Allah (Até amanhã se Alá quiser).
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros