Sábado, 27 de Setembro de 2014

DAS “LADIES NIGHT”, COMPLEMENTO E RAZÃO

 

Antonella Cinelli

 

“Ladies night”. Pelo visto e experimentado não poderei perorar – jamais aproveitei «uminha»! Pelo relatado através de devotas, sim, as estórias são inúmeras. Falam de strip masculino como se fora peça de carne que espera nota na tanga, de farra extrovertida, de copos e engodos, de olhares incendiários, de one night stands tão frívolas e inconsequentes como aquelas que muitas mulheres condenam nos respetivos e punem e a quente vingam. Erro primeiro: diz a regra, não eu, que a vingança é servida fria. Sobre vindictas tenho limitada teoria: menorizam quem as pratica. A consciência das vulnerabilidades pessoais é filtro indispensável para a compreensão dos outros. Como exigir a alguém o brilho poliédrico do diamante, quando o próprio cristalizou em grafite? Carbono puro em qualquer dos casos; um eletrão deslocalizado faz visível diferença. O diamante vale milhares e através do polimento reluz como joia. A grafite é condutora de energias várias, mole e untuosa. A negro, risca do papel a alvura.

 

Escreveu alguém, serem as mulheres “delicioso complemento” dos homens. Quiçá imprescindível, acrescento. A riqueza do pouco que aprendi, tem importante fatia recebida dos homens da minha vida. O pai foi, com luto o digo, exemplo maior de tesouro masculino. E não!, não lhe restrinjo o valor. Outros constituem o mesmo para quem os ama ou com eles privam.

 

Na interação amorosa bem-sucedida, o homem e a mulher partilham mútuo respeito, admiração, práticas diferentes, mágoas, desilusões que o balanço afetivo integra. E se é verdade honoráveis exemplares do sexo masculino alimentarem humorados estereótipos sobre nós, no regresso aos braços de quem amam, é positivo o riso e a alegria da Mulher cujo parceiro ajudou a tornar maiúsculo o «m».

 

Voltando às “ladies night”, especulo sobre uma das razões de existirem. À cabeça, vem o lucro dos empresários noturnos: encher os cofres em noites menores à custa de uma falsa igualdade entre sexos. Lamento se muitas das «ladies» contribuintes, à conta de farra liberta, somente na obscuridade cortada por flashes de laser exercem paridade da condição feminina.

 

O anedotário dos sexos não é um mal. Dele faço uso colorido. Como retoque de néon na corrida dos dias.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:42
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Segunda-feira, 13 de Janeiro de 2014

A VERDADE E A MENTIRA DAS MÃOS

 

 

   

Julia C. R. Gray – Her Mothers Hands                                 Laura Heaney – Washing Hands, Self-Portrait

 

Mãos/livro, mãos/disfarce, mãos. Do trabalho, revelam calos – enxós e enxadas endurecem a pele como uso de pasta com quilogramas em dossiês; diferentes as zonas coriáceas, idêntico o labor como razão. Unhas castigadas são testemunho de vida carregada de esfregões, óleos, terra, giz. E de mais: que lutam e renegam o ficar no regaço em calmaria indiferente se os dias tremem. Quando brilhantes pelo verniz, apenas contam arranjo recente. Mas é através da pele que o escondido fala. Se rugosa e manchada, conta idade ou envelhecimento prematuro por culpa do esgalhar quotidiano ou da falta de cuidado. Áspera e feminina, delata lixívias, detergentes, roupa torcida com esmero, agulha de quem costura ou cose peúgas, desinfeção frequente que creme não trata. Soe mentirem as mãos quando observadas levianamente. Precisam do complemente do olhar e da fala e do pensamento nela expresso para mais dizerem – o trajar é falácia que convém manter arredia. Fossem organizadas duas carreiras, uma com fotografias de mãos desligadas do contexto e noutra, rol de profissões, é de duvidar jackpot no acerto de ‘lé com cré’. O gesticular ajuda a abrir a página certa do dicionário das mãos. Mãos quietas que não condigam com emoções transmitidas alvitram suspeitas da autenticidade no sentir, contenção ou cartesianismo exacerbado. Mãos agitadas quando o relato é sereno, denunciam incoerência entre a paz aparente e o turbilhão interior. Suscitam curiosidade sobre o ausente no narrado. Manda o bom senso e o respeito pelo outro evitar perguntas, salvo se evidente a necessidade de aliviar carga que amachuca quem discorre. Ainda assim, com cautela, não quebre o cristal íntimo. Motores da «psi» também, escolhidos os instantes, necessitam de empurrão que os façam entrar no andamento preciso ao dono ou ao servo ou a ambos à vez, à vez.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

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Sábado, 24 de Dezembro de 2011

NESTE 24 DE DEZEMBRO

                                                                                                    Autor que não foi possível identificar

 Consoada dos simples. Também minha.

 

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

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Terça-feira, 26 de Julho de 2011

NA ESPLANADA SOMBRIA

Leonard Wren

 

Hora útil dum dia útil – como se não o fossem todos da semana e dos meses por serem necessário ócios para reestruturar a energia de quem trabalha! A perspectiva de actividade laboral até aos sessenta meados desanima – sob a capa do acréscimo da esperança de vida e do negrume financeiro, não tarda, a reforma será concedida rondando os setenta a idade. Altura dos achaques surgirem em catadupa. Tempo pouco de sobra para gozo da livre gestão de dias com qualidade. A dor na anca, a memória liquidificada que se esvai, o coração a precisar de remendos, a choruda despesa na farmácia que come fatia substantiva da esquálida «pensão».

 

Numa hora útil daquela segunda-feira, avançava a tarde. Esplanada sombria a combater o calor do fim de Julho, mais o ardor na pele de quem regressou da praia. O pretexto de água tónica com gelo e rodela de limão mais o livro empolgante sentou-a. A dois metros mal contados, duas mulheres falavam disto e daquilo. Trivialidades. Afundada na leitura, levantou os olhos ao chegar a bebida. Ouviu:

_ Já reparaste como morrem tragicamente alguns famosos?

_ Pois. Olha o que aconteceu à Lady Di, ao Angélico e à Ami Winehouse…

 

Marcou a página do livro. Olhar no vazio, reflectiu no que ouvira – tantas mortes e dores sofrem anónimas e jovens gentes ignoradas pelo vizinho do lado na colmeia de apartamentos. Mas, pela certa, não deixou de lastimar, quiçá escorrer lágrima pelo desaparecimento da princesa, da Amy e doutros que são comezaina nas revistas.

 

Tempos houve em que na comunidade do prédio, do bairro, ou da vila, o sofrimento de um não passava ao lado de todos. Neste, gelaram ou não medraram pensares solidários. Poucos fazem a diferença pelo estar atento na vida, entrecortando o lufa-lufa, substituindo pasmos frente às «têvês» por gestos de auxílio aos tais anónimos, àqueles que, por isso, não existem.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:16
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Segunda-feira, 14 de Março de 2011

CHÁ, NOZES E MENINAS EMP(R)OADAS

Lorenzo Sperlonga

 

Porque a semana surge intrincada com a greve das transportadoras, a procissão de crentes liderados pela CGTP nas ruas de Lisboa, a instabilidade social pelo «pacote 4», apetece frivolidade que alivie desprazeres. Segue junta.

 

Sendo dada a rejeições de locais confusos, ruidosos e entupidos por excesso de cabeças, não entro em centros comerciais. De cinco em cinco semanas, abro excepção – a Guida mudou-se para cabeleireiro sito num deles; sigo-a. Profissional competente, sem peneiras de «mete nojo» como soe quando a conta é directamente proporcional aos arrebiques do lugar.

 

Para fugir à moléstia, marquei para domingo, manhã, cedo, o embate. Hora, mais meia doutra, estava despachada. Apresso a saída. A caminho do estacionamento, passo pela loja onde me abasteço do chá preferido e que deve durar no armário tanto como o arranjo do cabelo. Desprezei talão e saco; chá directo para a mala. Sempre em corrida encho-me de coragem e no «hiper» compro nozes que, havia dias, apeteciam. Parcos metros faltavam para a salvação, outra urgência veio à lembrança. Pé ainda fora, outro dentro da loja, já o alarme apitava. As meninas emp(r)oadas olham-me de soslaio e recomendam nova tentativa. Obedeço. Recomeço. O mesmo. Uma das empoadas sugere um talvez: objecto não desmagnetizado. Retorno à loja do chá _ passam-no, novamente, pelo aparelho. Saio e nada apita. Entrada na loja das meninas empoadas – a comédia persiste. Queixo erguido, passo firme, retiro o objecto. Pago. A desconfiança das meninas continua. Uma delas, teimosa, pega no chá e vai à porta. Idêntico estardalhaço. Experimenta com as nozes – nada. Leva a mala aberta – ensurdecem os guinchos e eu arregalada. Pergunta se a minha roupa era de meia dúzia de lojas que enuncia _ É que, sabe, nessas marcas os tecidos podem magnetizar-se sozinhos. Flamejaram-me os olhos pelo disparate e insolência. _ Que nada vestia em estreia, mas não lhe competia saber disso. Mira os sapatos: _ São novos? Pelo reactor interno que explodia, costas voltadas, ouço: _ Se vai fazer mais compras é melhor avisar. Avalanche de palavrões à beira das cordas vocais; contive-a.

 

Dez metros adiante, descida para as catacumbas irrespiráveis. Acciono o comando do carro. Nada. Imagino o pior – falta de bateria. Tento abrir com a chave. Não cabia. Aparece o dono e atamanco o óbvio – enganara-me no veículo. Lugares adiante, lá estava o servo com rodas. Fujo. Só no ar livre, abro a janela e vomito repulsa. Vejo a hora: em vinte minutos após Guida, a cascata de absurdos.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

 

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Domingo, 26 de Setembro de 2010

ROLAVA, TRABALHAVA, PENSAVA NELA

Autor que não foi possível identificar, Gil Elvgren

 

Dos pneus sentia a aderência à estrada An. Corriam à desfilada as margens do alcatrão pela urgência do regresso a casa traduzida no velocímetro _ cedo demais para a polícia impor vigilância apertada na adesão dos condutores aos limites de rotações das rodas. Mais para a tardinha, previsto o regresso maciço dos «fim-de-semanistas» idos para fora da cidade que na semana útil os embrulhava - aderência ao voltar antes de escoado o dia possível não os motivava.

 

Na hora matutina para um domingo vago, pensava na adesão difícil entre os materiais escolhidos para cobrir o armazém. Remodelaria o projecto, exploraria outras opções. Segunda, reuniria a equipa. Que os cérebros em conjunto se atormentassem, que a aderência das placas inovadoras tivesse solução.

 

Rolava. Enfrentou outro afluente do rio de pensares que o preocupava. Pelo decréscimo de encomendas, sentia-se obrigado a reduzir o número de colaboradores no ateliê de arquitectura. Explicaria razões. O mau estar que sentia por quebrar vínculos laborais sabendo as dificuldades que enfrentariam até surgir novo trabalho. Qual seria a aderência de cada um ao facto? E a adesão dos restantes membros da equipa que liderava e nele confiavam?

 

Rolava. Trabalhava. Desistiu. Pensou nela quando se despia.

 

Nota: o texto foi intencionalmente construído para deslindar a confusão comum no discurso escrito e oral entre os termos aderência e adesão, sem que uso certo das palavras fosse respeitado. Qual seria?

 

Um dicionário informa:

 

aderência

s. f.

1. Íntima união ou ligação de partes (por acção!ação própria ou por compressão exterior).

2. Qualidade do que é aderente.

3. Acto!Ato de aderir (2.ª acepção!aceção); apoio.

adesão
(latim adhaesio, -onis, aderência, adesão)

s. f.

1. Acto!Ato de aderir.

2. Força que causa aderência.

3. Fig. Apoio, assentimento, cooperação.”

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:59
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Terça-feira, 9 de Março de 2010

ELA ERA COMO ERA

Autor que não foi possível identificar

 

"Ela era como era, e olhava-se como em esgares de gazela cobiçada, ágil e breve. Por isso lhe telefonava (a ele) porque lhe sabiam bem as palavras macias com que a mimoseava, o carinho, o mimo, as propostas lúbricas num charme de graça. Malhas dos dias e os desabafos que iam caindo em cada toque de telemóvel. Porque ele (o outro, o oficial), sempre de falo de em riste, era apenas uma sucessão de orgasmos, de me gusta mucho, de jactos mornos em zonas laterais. Ciumento_ contava. Gosto de me sentir olhada, as coxas brilhando numa saia mini, os bicos furando a renda da blusa, olhos babados de comensais, suspendendo o garfo.


O não amigo, o que recebia as chamadas, falava-lhe com um ar de anjo travestido em Mefistófoles. _ Mereces mais, sentes-te desconfortável na relação, pareces frustrada. Ela ripostava com as vezes que o outro riscava a parede por cada vez que (se) vinha, como nas vindimas se contavam os cestos. Há um lado puta em ti que ele não aprecia. É inseguro, bronco e toda a parafernália de insultos com que os preteridos enfeitam os eleitos. Ela aquiescia, e dizia-lhe a roupa que trazia vestida, a cor das cuecas, as mamas entesando por sabê-lo (ao do telefone) endurecer.


Quanto mais ciumento mais corno_ picava-a ele, sugerindo-lhe, como se fosse antibiótico, idas a sex shops, massagens e beijos na boca.
Depois seria fim de semana, e como acordado, ela repetiria gestos e gritos, humedecendo-se q.b. O telefone ausente como se não importasse.
Um pouco à guisa de crónica, pares que não casais trocariam número de telemóveis, olhariam de esguelha rabos de rapazes e coxas muito nuas de dançarinas em discotecas na moda ou muito pouco. Apenas mudava o nome dos perfumes e marca no elástico das cuecas.


Na segunda-feira, ele (o do telemóvel) falar-lhe-ia de bares giríssimos (onde não estivera) e onde garantia gostar de a ter levado num vestido muito curto. Do outro lado ela reafirmava orgasmos domésticos, palpava as pernas, sentia ardor.
_ Qualquer dia, fodo-o, pensou baixinho."

 

Nota: para o SPNI, crónica de Fernando York.


CAFÉ DA MANHÃ

 

 

 

publicado por Maria Brojo às 06:30
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