Arthur Braginski, Michael Godard
Ontem, há um ano ou nunca aconteceu? _ Não importa! Que a estória avance. Pelos quotidianos cheios, pelas vontades que vão e vêm, pela saudade de um charuto e conhaque partilhado ao som de jazz, chão atapetado como assento, pelo diálogo vertido e reflectido sobre sinais que do tempo vivido em Portugal e no mundo eram correntes, a urgência na mensagem recebida de pronto. Telefonema posterior e teimoso caído no silêncio programado do aparelho da mulher. Mutismo. Resposta escrita, passados eram instantes ao ter arribado idêntica saudade no outro lado da urbe. A coincidência de um ter visto do outro imagem no Facebook lembrando contacto desaparecido da rede social - o automatismo do sistema ignora e não rotula ausências deliberadas. Olhara, dissera ele depois, uma e muitas fotografias da omissa presença. Adviera o sentimento de falta. Isso fora de manhã, contaria à tarde, horas antes de rebate ter soado e imposto digitar caracteres breves no teclado minúsculo do móvel. Daí o telefonema e a mensagem/resposta pelo meio do dia descido.
Ontem, há um ano ou jamais acontecido? Tendo sucedido, um automóvel fez-se à estrada. No apartamento em zona nobre, vozes duas límpidas e alegres como antes. Memórias comuns. As transgressões. A clandestinidade que pica, adormece e acorda sem aviso prévio. O apetite pela conversa única que dois seres, específicos, enreda. Enredou na margem do rio, no tapete que a madeira escura do soalho cobria, no sofá para dois da sala/península porque rodeada de livros por todos os lados, excepto num. Em todos, o novo (des)conhecido de um par que se deseja. E foi. E foram mais uma vez amantes. E saíram ordenados por bússolas diferentes.
CAFÉ DA MANHÃ
Arthur Braginski, Carol Manasse
Inventa asas. Não esperes. Vem comigo planar sobre vales que separam montes, sobre faldas de montanhas, sobre lameiros. Na subida, sentir o despegar dos pés do chão, ver de cima o lá em baixo. Doutro modo. Doutro ângulo. Doutra altura. Vogar abaixo das nuvens, não se interponham entre os viajantes cujo motor é o vento e a abrangência que as pupilas recolhem. Abstrair dos liliputianos nas ruas, dos transportados sobre rodas, sobre rodilhas que lhes enchem de nada o viver. E se o império do oco ordena pesadelos e pressas e ânsias e baralha essências do respirar, também o da realidade «esquinuda» convoca igual.
Esquece, por agora, sermos feitos do barro comum a todos. Desmente a matéria e do etéreo constitui o ser. Vem! Sobe mais alto. Segue-me. Abre os pulmões, enche-os de puro, experimenta a leveza do ar e não fales. Sente a maravilha dos lameiros ensopados e do aroma que exalam. Atenta nas diferenças entre o emaranhado dum bosque, dum baldio, dos campos lavrados e adormecidos, dos pinhais. Não elabores, não penses. Concentra-te no rugir do ar em movimento que lambe encostas e desenha cumes. Ouve. Confessa: _ Há quanto tempo não te detinhas na exclusividade do ouvir? Pára. Um sentido de cada vez. É altura do ver. Distingues a espessura dos verdes rurais da escassez urbana? Assinala o arco-íris na banda/mistura de amarelos, verdes, azuis e malvas crescido do solo prenhe aguardando a Primavera.
Desce e conserva as asas. Jamais esqueças a viagem. Não confundas sentidos. Com distintos e complementares, sê liliputiano consciente, extasiado com o Gulliver que também és.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros