Segunda-feira, 1 de Dezembro de 2014

CASARÁS E AMANSARÁS

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Cecil Hayter

 

Conjugium satis est juvenem dominare ferocem - Casarás e amansarás

 

Outono coincide com o regresso ao lar e o desejo de nele renovar os dias. As obstinadas tentarão banir as resmas de roupa na cadeira do quarto. Eles, ardilosos se o dolce far niente está em causa, num resmoneio alegarão servir a cadeira para o arejamento das calças e casacos e cintos e gravatas aliás, ato higiénico ao evitar a contaminação do roupeiro pelo fato despido e, por isso, conspurcado de bactérias.”

 

 

Elas ensaiarão levar à prática a antiga frase publicitária da TMN: “...de manhã também é bom...” dispensando o “...a minha mãe gosta de tomar banho primeiro”. Eles, após o ereto acordar mictório, murcharão atributos e energia. _ “Fica para logo, «quiduxa». Agora não há tempo.” E vão ao computador, vêm as primeiras na televisão, fumam um cigarro, depois, disparando para o despacho da saída. Com a pressa nem reparam no gelo do beijo delas.

 

 

Na ânsia de mudanças que se vejam, já que das sentidas foi diluída a esperança, elas desfolham catálogos do IKEA, obrigam-nos a entortar o rosto como quem presta atenção mas tem olhos de vidro fixos no ecrã. Eles dão de barato o acordo ao não-visto e somente na tarde de sábado, metaforicamente enfiados «nelas», percebem a ratoeira. Arrastam a infelicidade visível de «homem-vítima-de-maníaca». Uns tristes, uns sem-abrigo da determinação feminina. Confrangem, pobrezitos...

 

 

Para doce regresso à conjugalidade outonal, deixo receita de uma amiga: se o parceiro emudeceu, ficou frio, sofre de cegueira seletiva ou embarrigou para cima de uma arroba de quilos, há solução: fazê-lo caminhar cinco quilómetros por dia. Ao fim de duas semanas estará a setenta quilómetros de distância. Nada mau!

 

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

 

publicado por Maria Brojo às 09:26
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Terça-feira, 18 de Fevereiro de 2014

DAS MULHERES, OS REDONDOS

 

 

  

Deborah Poynton                                                                                                     Kemp

 

Há ruído na comunicação entre homens e mulheres. Eles acusam-nos de até aos alhos pintarmos mil bugalhos. Dos molhos de pormenores até chegarmos aos factos. Soando o gongo para escutarem uma mulher, ajeitam-se no assento, acendem um cigarro e aguardam os preliminares. Jaz a beata no cinzeiro, engoliram o café e ainda descrevemos a moldura da substância. Trocam a perna traçada e, com vaga esperança de sucesso, interrompem para dizer:

_ Dizias que foste assaltada. Quando foi isso?

E nós abespinhadas:

– Não ouviste o que contei? Pois se acabava de sair do cabeleireiro, só pode ter sido às duas da tarde, ou esqueces que meia hora depois já estou no trabalho? Aliás, a Elisa estava impossível, e do corte de cabelo que pedi, comprimento médio com as pontas que ladeiam o rosto mais compridas, assim como a Victoria Beckham, vês o que me fez? A Talita afirma que fico com ar ladino. Tu que achas?

E eles que sim, que é verdade, que estamos ótimas, mas adiante.

_ Onde foste assaltada?

_ Era o que explicava antes de interromperes. Conheces a charcutaria que fica em frente do BES? Numa corrida entrei para comprar uns mimos mais umas fatias de peru fumado. Ao pagar, o terminal automático não funcionava e eu sem dinheiro. Já eram duas e um quarto, imagina!

Torcem o pulso buscando no relógio razão para o formigueiro nas cruzes. Com voz gelada, arriscam:

_ Levantaste o que precisavas no ATM e fanaram-to depois?

_ Não me deixas falar! Antes tivesse sido... Mas não. Pior, muito pior... Na conta, nem um cêntimo restava.

Aliviando a impaciência, rematam:

_ Ah, não foste assaltada.

A injuriada levanta-se. Vira costas com fúria tão alta como a bainha da saia:

_ És insuportável! Nem digo o resto. Fica bem.

Até ao carro, vocifera:

_ Todos iguais estes estupores; cretinos, egoístas, incapazes de ouvirem uma mulher.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:53
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Quinta-feira, 23 de Janeiro de 2014

GAIOLA DE VIDRO (I)

  

Tony Chimento

 

Uma casa. Nova. Torres de apartamentos, no conjunto, encerrados por grades. Jardins em construção. A cova da piscina forrada e vazia. Como as casas cujos compradores ainda não habitam. Porteiro e telefone na receção a impedir entrada livre da família, de amigos, o simples tocar da campainha e resposta pelo intercomunicador. Porteiro que ao comunicar com os proprietários vira costas a quem espera sob vento gelado, não seja recusada admissão por inconveniência do momento e exigida por resposta “não está ninguém”. Condomínio que de tão fechado engaiola quem lá vive. Liberta de intrusos, afasta a realidade quotidiana das paredes de vidro a partir das quais somente luzes e «luziratos» provam existir cidade outra, mais vidas além das resguardadas que ali fazem lar. Nem buzinas exaltadas sobem ao enésimo andar. Foi escolhido e obtido silêncio. Largueza e mármores cujo brilho encandeia. Dentro, madeiras nunca vistas, ambiente produto de estirador e decoradora. Onde ficas Lisboa das cantinas sociais que amparam misérias, dos desvalidos, dos embrulhados por jornais nos vãos que protegem, mal, da chuva?

 

Qualidade de vida(?) e luxo amalgamados. Beleza? Design raro? Impressiva arquitetura? _ Sim! Todavia, assusta a perfeição. Talvez quem assim opina seja campónia habituada a condomínios modestos se comparados àquele.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 09:20
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Sábado, 28 de Dezembro de 2013

CASA EM DESORDEM

 

  

Autor que não foi possível identificar                                                                                  Antonio Bartolo - A Brasileira

 

Garantia do poder entronado na governação. E uma mulher sai de casa para abastecer o despenseiro e, por três sacos com básico carrego, sofre um baque ao pagar. Se estava acostumada à Zara, muda para o chinês do bairro. Tendo cabelo rebelde, lava-o em casa e chega, pingona, ao cabeleireiro para um ‘brushing simplex’. Com a magra poupança, arrisca a manicura. À borla, lê as últimas leviandades dos famosos, o horóscopo semanal, receitas de culinária que enganem, a baixo custo, dente e olho, dicas para caçar um homem ou conservar o que tem. Anima-a ser tratada por menina, não esticar os braços durante meia hora para fatiar o cabelo que o secador esturrica, sair com as unhas coruscantes. Sabe como sol de pouca dura os luziratos coloridos – porque abdicou de empregada e pela falta de hábito, esquece o uso de luvas que protejam as mãos dos detergentes e esfregões. Talvez, pela noitinha, as besunte com um creme barato, se o cansaço não a levar para a cama sem mais lhe ocorrer que lavar rosto e dentes. Nem olha para a pele do corpo, outrora macia, hoje escamada pela secura. Ainda assim, louva a bem-aventurança da família, o trabalho que a sustenta e também preenche. Arregaça mangas e vontade em cada amanhecer.

 

A casa não está em ordem, nem, um dia, ficará. São parcos os haveres que o país não quer ou sabe adubar para depois, e por todos, distribuir. De outros «teres» possuímos fartura, alguns herdados, outros a cada dia adquiridos: o soalheiro e marítimo solo, outrora dito pátrio, na literatura, páginas de ouro que uma vida não chega para saborear, epopeias que extremos da Terra lembram, tradições e beleza que, independentes do suporte artístico, iluminam o olhar. E é gratuita a caminhada na areia que o vaguear do oceano molhou; gozar frescura e excelência na penumbra de uma igreja ou de um museu; acantonar o corpo nas sombras desdobradas pelo casario; navegar numa tela; «lamber» as formas que o cinzel esculpiu; descobrir que poucas são as vielas e os becos sem saída.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 07:00
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Quinta-feira, 27 de Junho de 2013

DE MARISA MOURA PARA A ADMINISTRAÇÃO DA CARRIS

 

Kenney Mencher

 

“Ex.mos Senhores José Manuel Silva Rodrigues, Fernando Jorge Moreira da Silva, Maria Isabel Antunes, Joaquim José Zeferino e Maria Adelina Rocha,

Chamo-me Marisa Sofia Duarte Moura e sou a contribuinte nº 215860101 da República Portuguesa.

Venho, por este meio, colocar a cada um de vós algumas perguntas:

_ Sabia que o aumento do seu vencimento e dos seus colegas, num total extra de 32 mil euros, fixado pela comissão de vencimentos numa altura em que a empresa apresenta prejuízos de 42,3 milhões e um buraco de 776,6 milhões de euros, representa um crime previsto na lei sob a figura de gestão danosa?

_ Terá o senhor(a) a mínima noção de que há mais de 600 mil pessoas desempregadas em Portugal neste momento por causa de gente como o senhor(a) que, sem qualquer moral, se pavoneia num dos automóveis de luxo que neste momento custam 4.500 euros por mês a todos os contribuintes?

A dívida do país está acima dos 150 mil milhões de euros, o que significa que eu estou endividada em 15 mil euros. Paguei em impostos no ano passado 10 mil euros. Não chega nem para a minha parte da dívida colectiva. É com pessoas como o senhor(a) a esbanjar desta forma o meu dinheiro, os impostos dos contribuintes não vão chegar nunca para pagar o que realmente devem pagar: o bem-estar coletivo.

A sua cara está publicada no site da empresa. Todos os portugueses sabem, portanto, quem é. Hoje, quando parar num semáforo vermelho, conseguirá enfrentar o olhar do condutor ao lado estando o senhor(a) ao volante de uma viatura paga com dinheiro que a sua empresa não tem e que é paga às custas da fome de milhares de pessoas, velhos, adultos, jovens e crianças?

Para o senhor auferir do seu vencimento, agora aumentado ilegalmente, e demais regalias, há 900 mil pessoas a trabalhar (inclusive em empresas estatais como a "sua") sem sequer terem direito a baixa se ficarem doentes, porque trabalham a recibos verdes.
_ Alguma vez pensou nisso?
_ Acha genuinamente que o trabalho que desempenha tem de ser excessivamente remunerado ao ponto de se sobrepor às mais elementares necessidades de outros seres humanos?

Despeço-me sem grande consideração, mas com alguma pena da sua pessoa e com esperança que consiga reativar alguns genes da espécie humana que terá, com certeza, perdido algures no decorrer da sua vida.”

Marisa Moura

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 07:37
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Terça-feira, 20 de Dezembro de 2011

JÁ FOI VADIO, CASTIÇO

Pablo Picasso, autor que não foi possível identificar

 

Lamento musicado. Questões da alma na voz e nas cordas das guitarras. Já teve xaile aos ombros e flor no cabelo da cantadeira. Já foi vadio, castiço, fado canção, banda sonora de filmes nossos e de fora. No José & Pilar, pré-seleccionado para Melhor Filme Estrangeiro, é a voz do Camané no fado “Já Não Estar”, também pré-seleccionado para atribuição do Óscar à Melhor Canção Original, que empresta fundo a isto de ter nascido português.

 

Porque do fado o que sei não vai além do gosto/não gosto e sendo gosto acompanha-me em leituras e afazeres, recomendo o que nesta ligação foi escrito. Aprendi e se alargar conhecimentos me agrada!

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

Interpretações diferentes do mesmo. As vozes são decisivas na perturbação que com cada uma delas experimento.

 

 

publicado por Maria Brojo às 07:39
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Quinta-feira, 16 de Dezembro de 2010

ÓXIDO DE FERRO III

Gil Bruvel

  

Enfadam-me campanhas eleitorais. Candidatos ao poder afirmam-se os melhores, lustram galões puídos, brandem espada de antes do bronze, o mesmo é dizer de ferro carcomido pelo óxido de ferro III, a ferrugem comum, que a humidade desfigura. Por tal, quebradiça, incapaz de angariar votantes. Alguns acabam por atender o respectivo suserano, mais por reza/vício do que por fé. Os não crentes em senhores da terra que a receberam em mandato e tomam por bem oportuno consideram-nos figurantes circenses. Nem de protagonistas merecem o nome por ensaiarem papel destacado e nele representarem figuras tristes.

 

A democracia é tesouro. Quem dela usufrui benesses é sensato preservá-las. Mas que as instituições e instituídos reguladores mereçam respeito – não apaguem inépcias anteriores e actuais, não caiam no logro de reclamarem respeitabilidade imaculada pelos putativos bons serviços em favor do povo português. A história da galinha, o passado lutador, a competência económica no período do betão, a experiência nos corredores poderosos são paupérrimos argumentos que somente embaciam a confiança popular.

 

É necessário resistir aos insultos à inteligência individual, à fadista “Guerra das Rosas” para conservar a credibilidade democrática, para não ajoelhar perante o fácil ‘bota-abaixo’ de que o parágrafo primo faz prova. Agressões sistemáticas por quem pretende reunir condições de liderança têm efeito de salitre que até protectoras madeiras de castanho velho e chapas duras corroem.

 

CAFÉ DA MANHÃ

  

publicado por Maria Brojo às 00:05
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Olá. Posso falar consigo sobre a sua tia Irmã Mar...
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