Anoitecera e chovia. Para trás, distância curta, duas mulheres irmãs, as meninas Brojo, ficaram na Unidade de Saúde de Coimbra. Por razões clínicas ali permanecem desde 5 de Setembro. Autónomas, orientadas no espaço e no tempo as mais das vezes, apetece trazê-las para casa. Interdição médica obstaculiza as harmónicas vontades familiares. “Não é possível”, “não pode”, “não deve” ouvido dos especialistas, é tradução de desgosto indizível. Corajosas, adaptaram-se, na outra, uma se apoiou, e são as meninas lindas do espaço como outrora o foram no povoado onde nasceram. Sorridentes, participativas, elegantemente arranjadas, têm palavras e gestos solidários para todos, mesmo para os que mal ouvem, gritam desvairados, circulam sem destino em cadeiras de rodas.
Vão para Lisboa reunirem-se à família. A “Casa de Repouso dos Leões” espera-as num T1. A filha e sobrinha única encarregada de esvaziar pertences de roupa, malas e calçado a casa da sua infância e adolescência – com vinte anos saíra para desígnio usual. Telefone, cabos ópticos desligados, frio de tremer ossos - recusa-se a ligar aquecimentos que lhe façam doer memórias do aconchego doutrora. Até sábado ou domingo, fará o luto dum tempo, dum espaço onde foi feliz dentro, a caminho do liceu, da faculdade, de regressos quentes à casa dos amores, hoje vazia até acender a luz do corredor. Por isso almoça e janta fora, não remexe o que a D. Lúcia deixou arrumado e asseado.
Saindo da esplêndida unidade onde dois amores irão jantar e dormir rodeadas de mil cuidados e atenções, a filha e sobrinha decidiu jantar numa
tasca próxima da casa de família. Recheio humano: um bêbado e dois à beira do mesmo, um dono surdo, uma mulher/esposa afável e boa cozinheira. Após a magra refeição insistentemente solicitada em dose mínima, o dono e a mulher devem ter considerado a mulher do canto mal alimentada. Paga a conta, cinco euros, trouxeram castanhas e jeropiga. Lágrimas corriam no meu rosto. Faltava a erva-doce que a mãe não esquecia, havia S. Martinho antecipado com desconhecidos, a sensibilidade de quem me pressentiu fragilizada, as primeiras castanhas do ano descascadas a só.
Nota: texto escrito com lágrimas involuntárias na face, enquanto hoje, ainda oito de Novembro em Chicago, um amor celebra aniversário. Parabéns ‘Branca de Neve’!
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros