Sexta-feira, 26 de Abril de 2013

PLATAFORMA 3

 

Chenoa Grace

 

Plataforma 3. O ‘Alfa’ preparava o pendular do Oriente para Sul. Aos magotes, gentes sem carregos, outras arrastando bagagens múltiplas cujo tamanho imponente pressupunha estadas longas no destino. Pelas etiquetas nas malas, denunciadas viagens com início a milhares de quilómetros e terminadas na Portela. Quem tais pesos conduzia mirava a luz soberba filtrada pela aços entretecidos na cobertura/escultura desenhada pelo Calatrava. Facilmente distintos os chegados de países quentes pelas écharpes presas no peito, pelos casacos finos que mal protegiam do vento teimoso naquela tarde de Verão, pelo bater das chinelas no empedrado. Rostos cansados donde já sumira a curiosidade novata.

 

Olhares insistentes seguiam os ponteiros dos relógios espaçados nas colunas. Anunciado o comboio, ajeitada a bagagem nas mãos e nas costas mochilas. Composição imobilizada, quem partia ia entrando porque demorada a paragem técnica, vinte minutos, para o bar poder, dali em diante, continuar a satisfazer fomes e sedes. Apaixonados não desfaziam os abraços, repetiam beijos de despedida com infinita saudade dentro ainda a distância não apartara corpos. Os embarcados a Norte aproveitavam o intervalo para cigarrar.

 

A mulher não ia, despedia-se. Sorria. Espalmava a mão no vidro até coincidir com a outra que o mesmo fazia. Malvadas janelas herméticas que não permitiam sentir a pele e adeus com o braço esticado até a figura se desvanecer! Não vigiava os ponteiros – podiam andar como caracóis que nada importaria. Reconhecia de vezes outras no mesmo lugar o casal adolescente com a caixa onde um gato assustado nem se atrevia a miar. Seguiriam juntos como o hábito lhe dizia. Pelos afagos, namorados, pensava-os. Faltava a idosa, coxeava ligeiramente, e a acompanhante. Ei-las apressadas mais o saco costumado.

 

Já as portas haviam cerrado e uma jovem mulher corria desafiando o horário. Ainda bateu à porta como se pedisse desculpa pelo atraso e licença para entrar. Mas não – insensíveis, as carruagens rolavam. Viu-lhe a perplexidade, a desilusão, talvez desespero no olhar. A que se despedia aconselhou falar com o chefe da estação e apanhar um táxi para Entrecampos. Talvez o comboio esperasse para depois compensar o atraso galgando o Alentejo. E ela muda. Sem reacção.

 

Desceu para a cidade. Na lembrança, momentos felizes e o indizível. Na ‘3’, devia permanecer, quieta, a jovem mulher.

 

Nota: post reposto na íntegra.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:18
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Quarta-feira, 13 de Julho de 2011

PLATAFORMA 3

Chenoa Grace

 

Plataforma 3. O ‘alfa’ preparava-se para pendular do Oriente para o Sul. Aos magotes, gentes sem carregos, outras arrastando bagagens múltiplas cujo tamanho imponente pressupunha estadas longas no destino. Pelas etiquetas nas malas, denunciadas viagens com início a milhares de quilómetros e terminadas na Portela. Quem tais pesos conduzia mirava a luz soberba filtrada pela aços entretecidos na cobertura/escultura desenhada pelo Calatrava. Facilmente distintos os chegados de países quentes pelas écharpes presas no peito, pelos casacos finos que mal protegiam do vento teimoso naquela tarde de Verão, pelo bater das chinelas no empedrado. Rostos cansados donde já sumira a curiosidade novata.

 

Olhares insistentes seguiam os ponteiros dos relógios espaçados nas colunas. Anunciado o comboio, ajeitada a bagagem nas mãos e nas costas mochilas. Composição imobilizada, quem partia ia entrando porque demorada a paragem técnica, vinte minutos, para o bar poder, dali em diante, continuar a satisfazer fomes e sedes. Apaixonados não desfaziam os abraços, repetiam beijos de despedida com infinita saudade dentro ainda a distância não apartara corpos. Os embarcados a Norte aproveitavam o intervalo para cigarrar.

 

A mulher não ia, despedia-se. Sorria. Espalmava a mão no vidro até coincidir com a outra que o mesmo fazia. Malvadas janelas herméticas que não permitiam sentir a pele e adeus com o braço esticado até a figura se desvanecer! Não vigiava os ponteiros – podiam andar como caracóis que nada importaria. Reconhecia de vezes outras no mesmo lugar o casal adolescente com a caixa onde um gato assustado nem se atrevia a miar. Seguiriam juntos como o hábito lhe dizia. Pelos afagos, namorados, pensava-os. Faltava a idosa, coxeava ligeiramente, e a acompanhante. Ei-las apressadas mais o saco costumado.

 

Já as portas haviam cerrado e uma jovem mulher corria desafiando o horário. Ainda bateu à porta como se pedisse desculpa pelo atraso e licença para entrar. Mas não – insensíveis, as carruagens rolavam. Viu-lhe a perplexidade, a desilusão, talvez desespero no olhar. A que se despedia aconselhou falar com o chefe da estação e apanhar um táxi para Entrecampos. Talvez o comboio esperasse para depois compensar o atraso galgando o Alentejo. E ela muda. Sem reacção.

 

Desceu. Na lembrança, momentos felizes e o indizível. Na ‘3’, devia permanecer, quieta, a jovem mulher.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:54
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Quarta-feira, 6 de Abril de 2011

SOBRE A BOA-FÉ

Chenoa Grace

 

Eixo Norte-Sul. Entupimento determinado por greves do Metro, ou da C.P. – se os autocarros omitirem serviço público pouca diferença faz no tráfego; caso este, o povo alterna por via de meios outros que no dia prestem serviço. A marcha sai incólume. Ouvi dizer na rádio eleita que o problema dos serventes do Metro é falta de equiparação às prerrogativas dos funcionários públicos que, nem de propósito, não os inclui. Sendo verdade ou mentira, irrita o prolongado calendário grevista que me torce o umbigo pelo que não têm nem são e pela altura escolhida para modificar estatuto profissional.

 

Os senhores empregados nas empresas estatais – pecha a exterminar - reclamam e amocham quem na carteira encafua passes dispendiosos tendo em conta o magro salário depositado à volta de 30 no mês. Ora, se na REFER entendo o escândalo pela ostentação de privilégios e despesismos vários dalguns quadros e dos administradores, no Metro, que saiba, há contenção relativa – estando ludibriada agradeço ser corrigida. Os taxistas aproveitam o furo d’oportunidade e aumentam em 30% a soma das corridas. Uns perdem, outros ganham, regras do jogo no ofertar e procurar. O mexilhão jamais salvaguardado.

 

Idos meses de mais em incertezas nos transportes. Pessoa de boa-fé marca data p’ra viagem sobre carris - pasma quando o serviço de venda de bilhetes online informa que não, que está enganada, que naquele preciso dia comboio sim, não ou talvez. Abóbora! Publicamente declaro-me farta da minha compreensão e benevolência iniciais que o abuso da índole tolerante converteu em patética.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

P’ra acalmar, outra voz portuguesa, desta com origem em Coimbra.

 

 

publicado por Maria Brojo às 07:22
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