Jinchul Kim
O Fernando Nunes Vicente refletiu, de modo leve e agradável, sobre um estudo inquietante do qual cito a parte sumarenta: “as meninas que em pequenas se deliciaram com os contos de fadas têm mais possibilidades de virem a ser maltratadas em adultas.” Direi, dando préstimo a termos ali adquiridos, que a revisão da «atitude textual» relativa aos contos de fadas não é nova. Desde há trinta anos que as histórias de princesas compassivas, pele branca, olhos azuis e lábios de rubi têm sido chicoteadas. Não à toa, pese embora a dívida de gratidão pela doçura dos sonos e sonhos da infância.
No anterior blog alinhei ideias sobre as representações subjacentes a tanta princesa adormecida, gatas borralheiras passivas e «rapunzeis» pacientes. A escandalosa complacência das vítimas perante bruxas e madrastas opressoras, príncipes ou monstros que o amor transfigurava, não podia ser bom presságio para meninas embaladas em partes iguais por fadas, biberões e papas lácteas. Tinha de dar no que deu - mulheres confinadas à subserviência face à família e aos ditames sociais.
Preocupante, é também o conceito, ainda hoje enraizado, de o que o amor transfigura quem toca. Beberrão, mulherengo, leviana, irresponsável, ou perverso, virará beatífico se tocado pela «varinha-de-condão» do amor. O pior é que muitas - mais elas que eles, convenhamos! - caem na ratoeira. _ “Ah, ele muda, verás, só precisa de uma oportunidade!” Uma, duas, três, «n» oportunidades. Gemem por volta da décima, quando a dor se sobrepôs ao orgulho. Aí, já as úlceras do espírito são mais profundas que as da carne.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros