O sol recolhe-se e anuncia a noite madrilena. Os ocres, os laranjas invadem o longe e o perto de Madrid. A tijoleira de revestimento da maioria dos complexos habitacionais, pela reflexão irregular da luz visível que multiplica os tons quentes, confere ao entardecer luminosidade estonteante.
Envolta a cidade no breu celeste, a iluminação urbana é feérica nos lugares/emblemas da cidade sem gente e triste. E não é por ser o final de Agosto que, normalmente, esvazia de nativos as capitais e soe trocá-los por hordas de turistas. Os madrilenos ou escolheram os 'pueblos' de origem para férias económicas, ou se mantêm em casa protegidos da canícula e da tentação de esvaziar os bolsos magros - o desemprego em Espanha é o segundo maior da Europa - numa bebida, num jantar na multiplicidade de sítios abertos. É verdade terem cerrado, temporariamente, as portas os mais célebres. Aberta a restauração acessível pelos preços. O turismo é quase nulo - Madrid também se ressente da crise económica europeia e mundial, ressalvando os países emergentes. No vazio do inolvidável "Geographic Club" (é pecado não entrar!), houve tempo para conversa com o proprietário. Foi categórico: _ "Madrid es muerta." Por outro lado, é refrescante estar numa cidade ícone do turismo sem ver manadas de orientais clicando por tudo e nada, reconhecer que os brasileiros constituem a maioria dos visitantes.
O luxo e o esplendor continuam a vigorar na oferta noturna. Uma pizzaria decorada como "La Tagliatella" jamais vi. Baixando o olhar da magnificência do cenário, entristecem as mesas desocupadas na maioria. Passado um quarto de século da "Movida Madrileña", nascida como reação natural dum povo sujeito a ditadura nas quatro décadas anteriores, o movimento contra cultural rapidamente alastrou a todo o país. "Pedro Almodóvar foi a maior estrela que surgiu naquela época e que alcançou projeção internacional e que se mantém até hoje no estrelato. Atuava no teatro e era cantor de rock-punk, onde se apresentava travestido ao lado de Fábio McNamara. Como diretor, cultuou o marginal nos seus filmes de forma ácida e crítica. Na sua filmografia, não há nenhum drama sem comédia e nenhuma comédia sem drama. Soube colocar os holofotes para a realidade do subterrâneo e que para a maioria dos conservadores e otimistas, era apenas o surrealismo de um jovem desvairado. A Espanha precisava mudar a imagem conservadora e reprimida. Necessitava se livrar dos resquícios da mão dura de Franco. Por isso, toda a transgressão foi respaldada principalmente pela classe política de esquerda. Queriam mostrar um país democrático, novo e principalmente, moderno."
“...Segue a movida madrileña
Também te mata Barcelona
Napoli, Pino, Pi, Paus, Punks...”
Não fora a tristeza que contamina o respirar de Madrid, este lugar belo no kitsch assumido estaria à pinha. No contrário, permiti-me a extravagância de brincadeira narcísica para depois rir de mim própria.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros