Miguel Avataneo
Não indago como o poeta: “quem sabe se a nossa sintonia não acaba em harmonia?” Entre nós, perdeu sentido. Harmonia conquistada à medida da nossa intenção. E mais não desejamos porque melodia encantatória. Falaste, contei eu, entre garfadas de carvoada. A noite tépida deste outono à margem da outra margem que Lisboa é. O murmúrio do rio ondulava. Cheiro a carvão na mesa da rua - dispensámos a clausura da sala e da esplanada emparedada em vidros. Aliás, pelo lugar rareiam escapes ou gentes que não venham ao mesmo que nós – jantar com Lisboa longe e perto. O pôr-do-sol, em descida de ouro a rubro, pintava o casario da cidade. Tejo aos pés lambia o friso de areia e a modéstia do par de embarcações ancoradas.
Perdemo-nos na beira-mar. Suave arrepio divagou pelos meus ombros e costas nuas. E andámos e sentámo-nos nos bancos de madeira cérceos do rio. Ao longe, um forró invadiu a fala e o silêncio. Fugimos. Descemos por carreiro entre socalcos de um jardim anunciado. Que outro povo se não o nosso abandona de esmeros orla fluvial tão bela? Falámos disso e daquilo, do desenvolvimento sustentado. Falámos da estação orbital que luz no negrume do céu mais do que astro brilhante e cujo nome recusou chegar à lembrança.
Não despedimos a lua que a noite recortava sem mudar de margem e ver o que vimos ao contrário. De novo, língua de areia (…)
Nota - Texto publicado, hoje, aqui.
CAFÉ DA MANHÃ
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