Quem se afoita a peregrinar por veredas escondidas entre S.Cosmado e Gouveia, meio quilómetro andado, é venialidade digna de confissão perante alma andarilha ou prior esquecer de virar costas ao destino e mirar o longe tão perto. O humilde e quase deserto «povo», encastoado como jóia na falda abaixo da “Curva Bonita”, escorre brancura. Ilusão por desaparecerem os granitos na mistura alva do casario recuperado. Nos ferros dos portões, das sacadas e molduras das janelas, impera verde-escuro. Talvez elo com os ciprestes, os plátanos, as tílias a mais de meio do estio. Descobertas as gelhas da montanha pelas sucessivas campanhas incendiárias. Neste Parque Natural, a replantação vegetal é metódica, lenta pela área incluída, demorado o crescer do arruinado em instantes. Terão os míscaros desaparecido na base húmida dos pinheiros que restam? E a carqueja? E a urze? Resistem as giestas invasivas, porém ricas no colorido quando assenta a Primavera.
Na entrada Nordeste do centro urbano de Gouveia, pontificam hortenses, folhagens perenes, homenagem escultórica ao operário de lanifícios, a ”Casa da Torre”, melhor, o Palácio dos Távoras, marqueses de Gouveia. Por ali, casa outra da qual é dito ter pertencido aos tetravós. Parece que o marido morreu cedo e deixou fortuna à mulher e filhos. Esta, jovem e ignorante dama no concernente a dinheiros, terá entregue a gestão dos bens a procurador aconselhado como sério e eficaz. Tão sério foi que a herança desapareceu em anos parcos. Já partiu quem poderia esclarecer o mistério da sobrevivência dos que ficaram desalentados, sem as mordomias anteriores e, quiçá, sem pão pra boca.
Passos adiante, palácios e palacetes obrigam a ler a rocha que borda telhados, emoldura janelas, portas amplas, burilada pelo cinzel nos brasões. A Igreja de São Pedro, construída no século XVIII, revestida com azulejaria portuguesa e granito nas cornijas, debruns e escadaria, eleva-se em torres sineiras. É orgulho da cidade e do largo fronteiro onde gentes desembocam à cata de serviços.
À direita de quem vira costas a São Pedro, a Igreja da Misericórdia - harmonia com a primeira nos azulejos/forro, no trabalho artesanal da rocha estrutura e enfeite. No lado oposto, o “Solar dos Serpa Pimentel”, outrora «os Correios», hoje entregue a mais adequada utilização que os habitantes serve: “Biblioteca Virgílio Ferreira”. O antigo “Solar dos Condes de Vinhó e Almedina” foi dignamente transformado no Museu Abel Manta cujo acervo exposto pede tempo ao visitante.
O ‘tout Gouveia e arredores’ não dispensa o “Café Central”. No interior vetusto, mesas, cadeiras e objectos d’antanho testemunham décadas de conversas, arranjos de negócios, arranjinhos. A esplanada reparte-se em duas: uma, à porta, beira rua, a segunda ocupa quase o terço do Largo de São Pedro. Dali partem encruzilhadas de ruelas, escadas que a mais dão, já que do sobe e desce é feita a urbe de montanha. Para galgar todas, calçado raso que o conforto do andarilho garanta.
E as telhas, senhores, as telhas! Cobertas pelo musgo dos anos, pedras em cima não as levantem borrascas serranas quando o vento uiva, desce alturas e varre encostas. Depois, é a aventura da descoberta, o risco da perdição nos cantos recatados que a curiosidade fascinam.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros