Susan Hoehn
Os portugueses amam a natureza e demonstram bucolismo invulgar que Júlio Dinis, Torga e outros não desdenharam. O mesmo revela o Ministério da Educação ao encerrar escolas (?) e, diariamente, obrigar crianças pequenas a serem enfiadas em carinhas que as conduzam a escolas maiores e afastadas, assim dando aos infantes a possibilidade de viajarem por montanhas e vales duas horas por dia – uma à ida, outra à vinda. Quem duvidar da nossa rendição às peregrinações campestres pelos excessivos níveis lusos do «cêodois» (CO2), erra. À conta disto, os (im)polutos europeus ameaçam Portugal com castigo maior que pau de marmeleiro; porém, atentassem eles nos extremos a que levamos o culto pela Mãe Terra, quiçá arrepiassem caminho.
Vejamos: espalhámos pelo mundo, através de ignotas estradas marítimas, descobridores, aventureiros, emigrantes, arbustos, flores, árvores de fruto e de grande porte, bosques. Figueiras, Silvas, Pereiras, Oliveiras, Nogueiras, Roseiras, Uvas, Pinheiros, Castanheiros, Matas. Mesmo insuspeitos Ramos largaram sementes em lugares distantes. Germinaram, resistiram e permanecem. Do engenho e trabalho fizeram armas no brasão que lhes permitiu integrarem-se, em geral, com harmonia nos países de acolhimento.
O nosso idílio com a natureza é tradicionalmente semelhante ao de marido ciumento com a mulher que ama: tem-na como sua, considera-a bem de serviço e do uso deixa vestígios. Um piquenique, a queima de matagal em campo agrícola, fumaça de um cigarro na beira de perfumada floresta, tudo serve para mostrar quem ama e domina. Quando o enamoramento termina em fogo e lágrimas, o português matuta, escandalizado, nos prejuízos nacionais e no destrambelhado incendiário. O zaping livra-o da desgraça, que a vida são dois dias, e detém-se numa novela ou numa dança com alguém. Para desanuviar.
Depois, há aquela idealização da vida ao ar livre. Gozo que português não dispensa é abrir a braguilha e, virado para um tronco ou arbusto, aliviar-se enquanto, deliciado, expira. Não levanta a perna, mas o resto é como o devido – abanica e arruma. Curiosamente, viver o desejo na praia ou no pinhal é prazer raro com ressalvas: parceira de aluguer ou candidata a affair. Se a necessidade for muita, tenta preliminar, mas tudo pica ou se enfia onde não é devido ou teme «espreita» que se babe com os próprios ou da mulher atributos. Além do mais, o zunido das vespas é incompatível com grunhir à tripa-forra ao som do Emanuel. E quando conduz sem descolar dos oitenta na A1 na faixa central para melhor ver o horizonte, amansada a família tagarela com um “calem-se porra!”, é ecológica a preocupação: ele, família e carro libertam menos «cêodois». O mundo agradece.
CAFÉ DA MANHÃ
Autor que não foi possível identificar
O quiosque da D. Rosarinho - tratamento carinhoso dos muitos que há muito a conhecem - integra o ritual das manhãs ditas úteis. Tenho para mim, que o conceito de utilidade aplicado aos dias da semana nada tem de pacífico. A classificação é escrava de ideia redutora: utilidade idêntica a serventia laboral. Finda esta, os demais dias são... inúteis. O que rejeito. A cada ano confirmando o antes tido como certo: é na proveitosa gestão dos dias-não-úteis que pacifico o núcleo da cebola que sou. A rentabilidade dos outros decorre disto. Como se a precária abolição da ditadura útil permitisse (re)avaliar as camadas que me estruturam, ajustar as importantes e eliminar as mandrionas.
Era falada a romaria ao quiosque, precedendo o café da manhã. Há saudações a lembrarem o arribar da vizinha ao fontanário da aldeia. O polimento é urbano, a substância remete a Júlio Dinis. Das capas das revistas e de alguns jornais faço download precário de frivolidades várias. Quem é a suposta barregã de quem, mudanças de amores, de narizes, enchimento de lábios, esvaziamentos celulíticos, auto-promovidos. O costume.
Na dispersão revisteira encontrei «gordas» preocupantes: _ A ciência ainda não chegou a acordo sobre a utilidade do sexo. Em subtítulo: _ Há fortes indícios que o sexo serve para combater parasitas(?) e eliminar mutações(??). Isto, logo pela manhã, engasga o dia. Agora, com a festa no melhor, é que me avisam?! Posto assim, o sexo mais parece medicamento com literatura inclusa: dosagem, princípio-activo e contra-indicações. E tantos se esmeram em atletismos sexuais, desempenhos, criatividade e coisa-e-tal... Nada disto faz, então, sentido! Alguém valoriza a imaginação no acto de engolir uma Aspirina? Séculos até aprimorarmos a libertação sexual e o prazer (nosso, que o deles sempre esteve legitimado) quando, afinal, nos limitávamos a desparatisação de rotina.
Comprei e li o resto. Voou suspiro de alívio - o tratado era reprodução sexuada versus clonada. Do mal o menos!
CAFÉ DA MANHÃ
Sugestão de C.
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros