Segunda-feira, 9 de Março de 2015

“ÉS BOM DEMAIS PARA MIM!”

Jan Bollaert ALL_YOUR_LOVE.jpg

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jan Bollaert

 

 

 

"És bom demais para mim." Abundam relatos em que este dito pontifica. O olhar perplexo da vítima conserva a estupefação inicial. E já revirou, dissecou, especulou sobre razão e significado de tão absurda classificação na escala da bondade. Entre quem disse e ouviu tudo parecia encaminhar-se para elo romântico, com direito a «amassos» e ternuras e mimos e seduções várias. Até um dia... O tal em que a guilhotina caiu sobre o afeto nascente. E o remate... o mesmo! Bondade a mais, faísca a menos.

 

 

 

Quando eles ou elas dizem frase de aparência tão banal e elogiosa, a descodificação é simples -"és uma excelente pessoa mas como isqueiro falta-te gás!" Ou então "o que tivemos deu o que tinha a dar. Toca a «basar»!" Fica um remoendo e outro voando sem culpa à conta de, até no final, ter sido tão, mas tão bonzinho. Pois se até cuidou de não deixar na sarjeta a autoestima do preterido...

 

 

 

Nos amigos vitimados por tal veredicto, constatei denominador comum: entregam-se com tal denodo aos retoques do amor idealizado, apaparicando o alvo do afeto, que este de duas uma - ou abafa sob tamanha devoção ou se atemoriza pelo retorno a que se sente obrigado.

 

 

 

Sem que fuja um angström da verdade, nunca tal fatídico dito ouvi ou me saiu da boquinha que, longe venha o dia!, engelhará como leque. Sou demasiado frontal para isso. Depois, há aquela mania de não alinhar em caridadezinhas oportunistas. A substância do que penso, se de afetos se trata, terá de ser coerente com o discurso. Poderei polir, mas não emboneco. E se amigo que muito prezo, substitui a verdade pela casca de banana da "bondade mal-empregue" como mandamento do happy end, é lá com ele. Rio, ao vê-lo discorrer sobre a receita. À prática digo não.

 

 

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

 

 

 

publicado por Maria Brojo às 08:00
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Segunda-feira, 6 de Maio de 2013

A PACIENTE INGLESA

 

Jan Bollaert

 

À beira dos sessenta, por entre brumas e smog, ela entretinha o vazio e a falta de hormonas vivazes na rede virtual que o longe aproxima. Visitava salas de chat ignorando(?) fundos lodosos. No silêncio doméstico, amparava-lhe o desamparo o romantismo do chintz esparramando das rosas a paralisia, repetido nos reposteiros da sala, na cabeceira da cama, na «senhorinha» capitonné que a melhores tempos assistira. Da ligação ótica à fantasia de mundos venturosos, não tardou a dependência somente igualada pelos litros de chá bebericados. Não, não se resignaria às compras de bairro, à reforma coroada por festa e ramalhete florido e mais canecas e bules e inutilidades cheirosas! Queria mais. Mistério e aventura. Afagos. Sexo que não arrotasse pubs. Bombons. Um homem.

À beira dos cinquenta, dúvidas tenebrosas. Ele omitia-as vazando encanto ao lançar redes da sedução onde calhava. Aconteceu pescar, entre brasileiras, portugueses, africanas and so on, a inglesa. Por facilidades próprias, foi à ilha da rainha conhecê-la. Entre chá e «sandochas» de pepino, a adrenalina piou baixinho. Manteve o polimento e, no regresso, deu folga ao laço. Sendo a fortuna marota, um exemplar de pescado antigo abriu - milagre! - as guelras e revelou escamas luminosas. Veio o romance, o «amor» aqui e ali sacudido por fanecas ocasionais.

Corria a vida assim-assim, quando a inglesa decide corresponder ao amável convite - chutado para canto no passar dos muitos dias - de vir a Portugal fruir do sol e do bombom lusitano. Caiu-lhe o mundo em cima. E agora? Inglesa com portuguesa finória, refinada trinitroglicerina. À namorada conta um conto: colega de trabalho à beira da reforma, convida-a por gentileza e não é que ela teve a insensatez de aceitar? Teria de a receber, fazer o sacrifício de ser escort por quinze dias. Mais nada. Mera cortesia e honra à palavra dada. Ouvindo mais que o relatado, a namorada viu feliz oportunidade de dissecar breus ocultos. Esperou, feita lagarta ao sol, o desenrolar da trama.

 

A trama

 

Laura

A inglesa diz chegar num sábado. Combinado previamente fim-de-semana com a namorada. Adia a vinda da inglesa por oito dias. Semana seguinte. Inicia na quinta, outro final de semana a dois. No sábado, abala para receber a «colega» no domingo. À chegada, o infortúnio prega dolorosa partida: ainda no aeroporto, a senhora cai e fica uma amálgama de nódoas negras e luxações. Ele relata o infortúnio à namorada. Põe a inglesa no hotel (disse). Na manhã seguinte, o estado clínico piora. Centro de Saúde com ela. Nada partido. Um analgésico que a dor não alivia. Trá-la para casa e para a única cama. Ele cozinha, cuida da doente e dorme com ela. A coisa piora. (...)

 

Nota: o texto continua aqui.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:41
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Sábado, 5 de Janeiro de 2013

RISO, SOPA E MAIS

 

Jan Bollaert

 

A família do “Escrever é Triste” tem vindo a libertar-se dalgumas contenções linguísticas. Num rabisco, perorei sobre elas a partir de São Tomás de Aquino: “brincar é necessário para levar uma vida humana”. Defendo o mesmo: gargalhar repõe no espírito energia que o corpo e os dias agradecem – é dado como provado que o riso liberta hormona, endorfina, que para o cérebro importa sensação de bem-estar, alivia dores e tensões. Uma boa piada ou encarar os fatos com bonomia e humor, são melhor remédio que pílulas a granel. Porém, o que faz grasnar de alegria um sujeito ou um povo não garante que noutro, diferente, almeje o mesmo. Os ingleses pelam-se por trocadilhos, os franceses e alemães pelo nonsense, os stars & stripes preferem gracejar sobre assuntos locais. Seja qual for a língua ou a herança cultural, afirmam sabedores que o gracejo deve brincar com o efeito surpresa para a universalidade do riso acontecer.

 

Richard Baxter

 

Por cá, o autêntico vernáculo, condimentado pela gíria, está para as anedotas, como a batata para a sopa; se de legumes melhor - grelos, ervilhas, nabos, ***alhos, tomates e pepinos servidos por curto e eficaz enredo, levam muitos portugueses a lágrimas galhofeiras. Noutra vertente, explosão de génio servida por um vigoroso “porra!” dizem fornecer maior alívio do que um “fosga-se!” desenxabido.

 

Millôr Fernandes defendia que “o nível de stress do indivíduo é inversamente proporcional à quantidade de “foda-se! que espirra.” Perguntava se existe algo mais libertário do que o referido conceito para, em seguida, justificar: “O foda-se! aumenta a minha auto-estima, torna-me uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Liberta-me. "Não quer sair comigo?! - Então, foda-se!". Rematava abonando o direito do termo na Constituição.

 

“Filho de muitos pais” veio substituir com a clássica «delico-doçura» social expressão antiga que envolve ‘senhoras’ dadas a acasalar se remuneradas. Não tem enésimo de expressividade da antiga. Perante desmando institucional ou privado, um "puta que o pariu" bravo e forte põe nos eixos a emoção.

  

E pensar que não me atrevia além do “puxa”, do “caraças”, ou d’une merde ocasional.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:41
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Sexta-feira, 28 de Dezembro de 2012

PRINCÍPIO DA INCERTEZA

 

Jan Bollaert

 

Também o que deu nome à trilogia da Agustina Bessa-Luís. Princípio da Incerteza – não é possível prever com rigor o comportamento de uma micropartícula. Lembro as teorias da Relatividade - energia e massa como semelhantes na essência, espaço e tempo interligados. Apelo à Mecânica Quântica – a matéria é em simultâneo onda e partícula. Os eletrões e outras partículas subatómicas dançando em harmonia com os átomos, estes com os ajuntamentos que constroem (as moléculas) e com os planetas que pulsam ao ritmo do sol e, com ele, do cosmos.

 

A biologia prova a coreografia perfeita do universo – o sémen que ascende ao óvulo, a circulação sanguínea, os ciclos menstruais harmonizados entre mulheres que durante algum tempo permanecem juntas, a sincronia do coração e do respirar. Até os relógios de Huygens acabaram por oscilar em simultâneo e ignorarem o descarto inicial. Os saltos precisos do átomo de césio de um nível energético para outro definem, nos relógios atómicos, a unidade de tempo (SI – Sistema Internacional de Unidades). Erro de compasso inferior a um segundo em vinte milhões de anos. A matéria – viva ou não – bailando ao mesmo ritmo. Caos síncrono, irrepetível, organizado por formulação matemática. Determinista. Passado, presente e futuro como resultado da imparável e sussurrada comunicação matemática e física e química entre partículas.

 

Jan Bollaert

 

Einstein e as pontas da teoria unificadora dos campos – zonas do espaço onde forças gravíticas, elétricas ou magnéticas confluem. Visionário, louco, excêntrico segundo contemporâneos. Genial pela intuição lógica e suporte científico. As vidas encaradas como perspetivas individuais duma realidade única. Julgadas distintas pelos humanos não o sendo enquanto são. Espectadores de um palco que pensam cheio e onde impera o vazio.

 

Poema budista completa:

Vazia e calma e livre de si

É a natureza das coisas.

Nenhum ser individual

Na realidade existe.

 

Não há fim nem princípio,

Nem meio.

Tudo é ilusão,

Como numa visão ou num sonho.”

 

Texto publicado aqui.

 

CAFÉ DA MANHÃ


publicado por Maria Brojo às 11:02
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Quinta-feira, 12 de Julho de 2012

FAZER DE CONTA

Autor que não foi possível identificar, Jan Bollaert

 

Da crisálida no seu casulo, mais cedo do que o previsto, houve mulher com criança dentro. Porque da dormência das sestas adultas, na infância, constituíra reinos e da precária liberdade experimentara magia, aprendeu a deter-se. No silêncio, jogar ao faz de conta. Uma e outra e outra figura. Personagens múltiplas que viria a integrar enquanto despia e vestia sedas da mãe copiando gestos de filmes antigos que o preto e branco coloria.

 

Desequilibrada nos saltos, encenava graça e langor no palco que o espelho devolvia. A sedução da mãe, das mulheres de Hollywood repetidas no descalçar da meia e na alça caída do ombro por suave estremecer. Um dia, sua. Egoísta pela relevância do querer, houvesse ou não quarto cheio de homem que a visse.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 16:42
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Segunda-feira, 26 de Setembro de 2011

MANUAL PREVENTIVO

Jan Bollaert

 

Quem se dispõe a restaurar casas antigas em que pesam décadas com portadas encerradas, vazias de humanos, recheada de bicharada de todos os tamanhos abaixo dalguns, poucos, centímetros, como decorre da medida isenta de rataria, depara-se com outras ratices e ratarias. Aprender a lidar com estas é mais difícil do que colocar, estrategicamente, ratoeiras com isco. Para mulher sem ardis à altura não é pêra doce. Vale que após um mês, sendo menos lerda do que eu dou-lhe uma semana, aprende a descodificar o dito pelos «artistas» imprescindíveis às reparações estabelecidas. Apanhando mulher que presumem e acertam como rudimentar nos saberes que dominam, é “um ver se te avias”. E já se aviaram dois até agora. A mais será árdua a tarefa de endrominarem porque perdida a inocência original; agora, pelo menos, sabe comparar a qualidade dos materiais nos orçamentos, opta por paga à hora em trabalhos determinados, empreitada em situações que a justificam. Escolhe a dedo os candidatos pelas referências fidedignas, pela conversa, pontualidade na entrevista e no dia aprazado para início da obra.

 

À custa dos erros cometidos, atingiu alguma competência. Deixou de se fiar em telefonemas/promessas, no “é para hoje e ligo à tarde” nunca concretizado, em orçamentos vagos e estapafúrdios, em especialistas que só armam tenda de empecilhos traduzidos em despesa exacerbada, que dão marretadas indevidas destruindo o são e engendrado novo motivo para intervir. Perante o estrago atribuído à velhice do material que não aguentou a pancada, têm resposta afiada pelo treino: _ “Não se preocupe que disto há muito; ficará melhor e mais fiável que antes.” Pois é, não fora nova linha na factura justificada pela astúcia que a proprietária adivinha. Daí, aquando da primeira visita, zelar pelo pertence ao ver ferramenta pesada e desnecessária próxima ou nas mãos artífices. Antecipa o gesto/perigo e frisa: apenas pretendo que avalie, pois da solidez estou informada (fotografar o antes dá arranjo) - o conhecimento buscou-o através de sabedores próximos com generosidade bastante para aturarem perguntas imbecis.

 

A mulher, eu, reuniu, finalmente, equipa de trabalho de quem gosta e a gosta. Paga justa, tratamento respeitoso e compreensivo. Por ora, voltou ao espírito naturalmente confiante que a caracteriza. O “pé atrás” em relação aos outros incomoda-a. Não é assim na matriz, violenta-a suspeição sistemática, quiçá injusta!, de alheios.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:52
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Quarta-feira, 14 de Setembro de 2011

PORTUGAL/«CHAINA»

Jan Bollaert

 

As lojas chinesas inspiram opiniões contraditórias. Recusa entrar num desses ‘antros’ quem respeita o comércio tradicional, os produtos vendidos por nacionais, alguns com etiqueta disfarçando terem sido produzidos na China, quem abomina cumplicidade na exploração da mão-de-obra infantil que julga (será?) predominante no fabrico do à venda no pequeno comércio chinês em Portugal. Outros são fãs pelo menor custo do pretendido, pela consciência de também as marcas de alta-costura utilizarem tecidos ou mandarem confeccionar o prêt-à-porter no Oriente onde as rechonchudas mãos dos petizes depressa adquirem calos e a condição de escravas sob o jugo de patrões déspotas. Aliás, semelhante acontece com adultos, conquanto reputado de mais cruel o sistema legal que não protege as crianças. Noutra vertente, é logro pensar o made in Portugal como bom e péssimo o arrumado nas prateleiras onde o carimbo made in China impera. Quod est demonstratum, o ‘não entro’ em lojas chinesas é inconsistente e primário. _ "Metem nojo", acrescentam. Gostaria de ainda respirar quando a China tomar conta do mundo!

 

Não sendo mulher de nojos por dá cá palha aquela, recuso-me a discriminar negativamente onde posso adquirir por menos o necessário, salvo se «escaldada» com um produto ou outro, ou suspeitando origem larápia. Estes deixo-os em seu sítio e retiro aqueles de provas dadas em qualidade e serventia. Vem o arrazoado à colação por urgência de ferramentas esquecidas de comprar na loja ‘tem-tudo’. Estando fechada das 12.30h às 14.30h - a pressa requeria solução -, foi descida estrada e, quase fora de portas da cidade, aberto um «hiperchinês». Já em função o comprado, resistiu com honra a dias de uso. Nas duas horas de ‘fechado para almoço’ da portuguesa ‘tem-tudo’, quanto foi adiantado na remodelação duma casa de banho… E se o tempo é dinheiro, mais foi poupado além do incomparável menor custo.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:09
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Sexta-feira, 27 de Maio de 2011

CARA DE BONECA

Jan Bollaert

 

Quando ela entrou para o comboio, já vinha com cara de boneca. Rosto quadrado, lábios quase sintéticos, olhos escuros, meio encobertos pela franja perfeita de um cabelo que parecia peruca. O único movimento que traía a sua fisionomia de brinquedo era o contínuo mascar de uma pastilha, que resistia apesar de sucessivamente esmoída pelos movimentos basculantes do maxilar inferior.

Encostou-se junto à porta, na posição de máxima interferência com a saída e entrada de passageiros, e iniciou o processo. Qual processo? O de se embonecar ainda mais. Tirou da bolsa um estojinho, abriu-o e, com um pompom, aplicou um pó qualquer sobre o rosto. Fê-lo com movimentos precisos, conduzindo com destreza a almofada pelos contornos faciais, várias vezes sobre cada ponto, até dar-se por satisfeita.

Mas o serviço não estava completo, longe disso. O estojo voltou para dentro da mala e, em troca, surgiu o pincel - não um qualquer, mas um desses de cabeça larga e pelagem fofa, bom para tortura nos pés. Com a mesma habilidade, a rapariga valeu-se do utensílio, em garbosas pinceladas nos cantos essenciais da face.

Eu, sentado a meio da carruagem, na minha posição de moribundo matinal, já começava a quedar hipnotizado pela cena. E mais ainda fiquei quando o pincel foi fazer companhia ao estojinho e da bolsa emergiu uma espécie de caneta grossa, como um bastão de cola. Não colava, mas preenchia. O quê, não me perguntem, pois a pele da miúda, congruente com a sua idade, ainda estava despida dos vales epidérmicos da progressão etária. Mas ela lá sabia, e entreteve-se durante alguns minutos a retocar alguns pontos invisíveis de imperfeição. O que ela fazia com aplicações leves e cirúrgicas, eu não conseguiria nem com duas demãos de massa de pedreiro.

O comboio já ia a meio do caminho, com mais passageiros em pé do que sentados, incluindo o meu objecto de estudo naquele dia. Cogitei onde ela trabalharia, para ser precisa tanta maquilhagem. Intrigava-me também como o constante esforço na mastigação da pastilha não comprometia o revestimento facial recém-aposto.

Mas a rapariga não dava tréguas para reflexão profunda. Era um produto atrás do outro que saía daquela mala. Depois da caneta grossa, veio outra, fininha, para o contorno dos olhos. A seguir, um lápis para o lado externo da pálpebra. Depois, outro para a borda interna da mesma. Uma escovinha de pentear as sobrancelhas. Outra para os cílios. Uma coisa qualquer para a testa. Batom. Brilho. Reforço. Lustro.

Quando eu julgava esgotadas todas as possibilidades, ela avançou para o cabelo. Uma escova para alongar, outra diferente para enrolar a franja. Um espelho para os retoques finais. À chegada do comboio ao Cais do Sodré, estava no spray, aplicado sobre a sua arquitectura capilar e o ombro do passageiro ao lado. Desceu na estação terminal com mais cara de boneca do que quando entrara e deu com uma amiga, que também vinha no mesmo comboio.

- Olá, estás boa? - disse e cumprimentou-a com um beijinho, daqueles em que apenas as bochechas se tocam. Temi que as duas ficassem para sempre com a cara colada. Mas não, havia muita ciência naquela maquilhagem.

 

Nota - “Cara de boneca” por Ricardo Garcia com a prestimosa ajuda do António a propósito do texto aqui publicado “Batom-Cola” no dia 18 de Julho de 2010.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 07:09
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Quarta-feira, 8 de Dezembro de 2010

QUANDO UM ÍDOLO MORRE

 

Jan Bollaert

 

Normalmente pessoas que, pelo talento ou carisma, entusiasmaram milhões. A menos de meio da idade adulta. Tragédias inusitadas que obrigaram despedida das vidas: tiro certeiro, acidente, suicídio encenado/assassinato, excessos ou loucuras. Assim nasce um mito, assim é iniciado período longo de especulações – o que fariam, quais os contornos dos respectivos progressos se ainda respirassem. Quais as benfeitorias deles provindas que nos enfeitiçariam ou dariam asas ao viver pessoal.

 

 

Daniel Green e autores que não foi possível identificar

 

Para o mundo e pela exposição mediática, o cinema e a música levam a dianteira no rol dos considerados ídolos finados cedo: James Dean, Marylin Monroe, Janis Joplin, Elvis Presley, John Lennon, Bob Marley, Michael Jackson. A escrita e a pintura também recolhem nostalgias: Guy de Maupassant, Gogol, Vincent van Gogh e a mui nossa Florbela Espanca. Na sociedade e política, Cleópatra, Allende, Evita Péron, John Kennedy, Sá Carneiro em Portugal. Florbela Espanca nada num 8 de Dezembro há século e alguns, John Lennon morto há 30 anos no mesmo dia do mesmo mês.

 

 

Linda Koast e autores que não foi possível identiicar

  

Quem idolatra génios, ou tomados como tal, e neles projecta a vida própria demora a fazer o luto, cria lendas e fantasias, interioriza mágoa que, vezes tantas, desequilibra a «psi». A rejeição da morte é fardo garantido para a maioria de nós – encarar o fim da rota dói ou porque exaltamos o ego, ou por não aceitarmos vermo-nos privados dos amores que nos erguem. Esquecemos que a Dama de Branco, ao chegar, impede carregarmos bagagem de memórias.

 

CAFÉ DA MANHÃ

  

publicado por Maria Brojo às 12:02
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Quarta-feira, 26 de Maio de 2010

SOBRE OS ‘CASADOS’ SEM SEXO

Jan Bollaert

 

É afirmada, pelo masculino, banalidade hipócrita de mulherzinha o ‘vade retro homem casado que me tente’. Confronto ocioso se atendermos que para adultério são necessários dois sem distinção de conjugalidades e géneros impressos no B.I. Irreverências, momentos, desejos da carne, da persona ou da pessoa? Porque não? O cerne reside no depois das promessas e juras. Quando é perpetuado o nem sim, nem não. Quando, e tantas vezes ouvimos!, os parceiros/terceiros ficam suspensos na paixão, em dependências cerceadoras da liberdade individual. Ao rebelarem-se, ensaio de fuga, resposta:

_ Aguenta que está por pouco. Hoje não lhe disse de nós porque ele(a) vinha indisposto, instável, impossível. Conto amanhã. Peço o divórcio, mal venha a jeito. Mas amo-te, quero-te tanto! Às cinco?

E eles esperam. E as cinco que não chegam. E a ânsia em crescendo.

 

Chega. Relógio à mão, telefone no silêncio. Entre uma carícia e um espasmo olha as horas. Às tantas, intervala meneio e beijo ao enfiar a roupa.

_ Não me ligues. Assim possa, falo. Estou atrasada(o). Fica bem!

O falo e a fala adiados para oportunidade melhor.

 

À chegada ao lar, bendito lar!, a segurança, afectos. O conhecido. Os miúdos. As rotinas, que também as há, benfazejas. O outro vértice que aguarde o tempo da carência ou do apetite ou da sorte. Que aceite a subjugação. O domínio do nem sim, nem não.  

 

Cada um de si conhece o querer. Opte. Recolha nos dias o bem-estar pessoal. E que sejam abandonados estereótipos: o da hipocrisia e os do reconto.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 06:15
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