Quarta-feira, 20 de Abril de 2011

HAJA SAÚDE E COZA O FORNO!

Jean François Millet, autor que não foi possível identificar

 

Em tempos de miséria outros, das quintas poucas e das muitas parcelas estreitas advinha sustento que, a par da capoeira e do porco na 'salga', dele carnes fatiadas, presunto e fumeiro duravam um ano, havendo parcimónia e poucas bocas para alimento. Sendo muitas, pão com azeitonas era janta. Quem na Beira Alta tinha um forno, a troco de tostões, cozia pão centeio e broas e trigas – escassas estas por naqueles chãos e clima o trigo se amofinar com as geadas e neves. O horizonte de felicidade das gentes resumia-se a pouco – “haja saúde, coza o forno, e o pão seja para nós!”.

 

Dos pés descalços e tamancos, dos aventais e xailes, dos lenços que protegiam carrapitos empertigados, foi longo e tortuoso o carreiro andado até hoje. “Vem aí o desenvolvimento!” foi notícia que de tão ouvida sem ninguém dela ver proveitos, se assemelha aos gritos do Pedro ameaçando com o lobo. Quando chegaram indícios de progresso, a morte arribara primeiro. Seriam netos e bisnetos a viverem benfeitorias prometidas aos antepassados. Aos poucos, deixaram entregues às silvas e giestas desordenadas os lameiros.

 

Sem troika negocial que nos valha em breu tão espesso, indo a Saúde de mal a colombianos, dado Portugal como país de risco no que concerne a motins e conflitos sociais, não cozendo o forno, nem sendo para nós o pão, ai de quem recuar nas «As» muitas para os poucos que somos a caminho de hortas e canteiros donde provenha complemento aos esquálidos sacos de compras. E lembro dois amigos desafogados financeiramente que aos fins-de-semana e nas férias saíam de Lisboa, olhos postos em miraculosas horas de ar limpo e com enxada na mão. No regresso, orgulhosos, postavam na cozinha as primícias da terra semeadas e colhidas por eles. E quem vendeu as leiras ou nunca as teve? Que se legitime arrendar e cultivar fracções de baldios - hortas/jardins são preferíveis a manchas com tojos e poeira no ar. Sem elas e sem varanda é difícil o remedeio, mais não seja para vigiar o crescer da salsa, da hortelã e do manjericão.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:19
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