Kim Parkhurst, Jennifer Janesko
Quando os irmãos Grimm escreveram o Príncipe Sapo, mais não fizeram que dar forma escrita a um dos mitos e ilusões humanos e, de caminho, desmenti-lo.
Consta as mulheres sonharem com um belo príncipe devotado e que possua merecimentos capazes de o tornar progenitor exemplar, os homens com princesas diáfanas, lindas, generosas, ternas e lábios de rubi. Um sapo como parceiro(a) está normalmente arredado do imaginário. A fealdade, a estranheza que comporta, não obedece às normas primárias da sedução. E na busca iludida dos príncipes e princesas se frustram expectativas, acontecem desencontros infelizes.
Atentássemos nas rãs e princesas, nos sapos e príncipes que convivem no íntimo de cada um, menor seria, nos afectos, a teia de enganos. Nos dias e destes nas horas, alternam comportamentos individuais em que nos lábios de rubi, na pele macia espreita o batráquio que nos outros merecem condenação. Aceite a dicotomia luz/breu, a passagem de um estado a outro nas gentes, sairia desmentido o mito e melhorados os relacionamentos em geral, românticos em particular. A esta evolução da consciência é costume chamar amadurecimento e crescer harmonioso, sem parança, até ao fim.
Existem pessoas certas ou erradas para cada um de nós? _ Não e sim, o que é distinto do «nim». Profunda divergência nos valores contribui para o assentimento na resposta. Havendo alicerces comuns nas estruturas da matriz de cada um dos elementos do casal, as restantes variáveis perdem importância se compensado o momento sapo ou rã do outro com o surgir da princesa e do príncipe por parte de quem com ele partilha a vida. Como numa balança de dois pratos, o importante é o equilíbrio satisfatório na posição média do fiel.
CAFÉ DA MANHÃ
Jennifer Janesko
De cabo a lado português não existe canto sem fumeiro exposto. Tanto fumeiro reunido em festa promete azia. Vinhos e queijos acolitam. Olhares cobiçam. Cabeças adquirem e mãos estendem papeis/notas. Recolhidos trocos, adiante que noutra banca mais haverá para comprar. Para empanturrar a viatura. No regresso, cheiro a alheiras de javali e a «serras» contidos por ligaduras de algodão branco. Durante ócio concedido, trocados por bens genuínos fumaças de lenha podre e boatos e boateiros e bocarras e bolsos rotos cozidos à pressa.
O Entrudo só o é alimentando ruralidades veras e ginetes com tradição. Ao domingo, cangas nos bovinos literais apenas no último antes da quarta de cinzas. O resto é Carnaval. Pela sexta já aviada, nas escolas, a criançada estreou contentamento vestido com fantasias inocentes. Copiados ícones de ecrã ou antecipadas profissões que a volatilidade dos sonhos desmentirá. Sevilhanas, rainhas, fadas, cowboys perdem clientela em favor de enfermeiras, médicas e bombeiros. Nem um infante escolhe toga «tribunalesca», máscara de político ou de professor. Sinal bom porque ainda protegidos da conflitualidade/banalidade quotidiana. Em tempo de desgraças, conjugam ideiais e protagonistas, heróis do presente. Felicidade fácil e pura, ajuntados euros que os pais exibam, orgulhosos, pela mão. Por cá e até hoje dentro, corre(ra)m dias de rentabilizar o gasto, gastos e desgastados arremedos tropicais.
Povo que não ri, nem brinca, nem se cumpre na alegria, esborratou pintura de esperança. Valem os Entrudos mais as «matrafonas»; brilham penachos e lantejoulas, partes das partes distantes, símbolos de calor nos corpos e almas, das cinzas não chegarem com o amanhã. Precários, devolvem a gentes bem-aventuradas pela ilusão o que, por direito, lhes pertence e não pôde, ainda, ser roubado.
CAFÉ DA MANHÃ
Jennifer Janesko
A «descoisa» clássica chamada derby foi comummente precedida pela chegada dos adeptos encarnados ao verde careca de Alvalade. Pela descrição dos cuidados policiais, parecia estar o Campo Grande e 2ª Circular sujeitas a terrorismo «etista», da Al-Qaeda ou do Hamas.
Inocentes condutores, no regresso a casa após dia de estafa, aguentaram em fila (im)paciente a marcha guerrilheira e gritada dos «tifosados» lisboetas. Rivais, são ditos. A «descoisa» tem piada: espicaçam-se mutuamente, insultam-se, olham, unanimemente cobiçosos, as capitosas meninas dos pompons, aliviam testosterona na forma de rugidos. Começado o desafio, a «mole» química vira humana. Primitiva, mas de homo sapiens feita. Berra impropérios contra o Di Maria e outros atrevidos nas balizas.
Conquista de bola expulsa contendor. Goooooooooooooolo do Benfica!, David Luís e um a zero. Onze contra dez, como vai sendo hábito. Sporting desaustinado. Os comentadores multiplicam adrenalinas e observações extraordinárias – “peixe num aquário”, uma delas. A multidão espectadora – esperada e não chegada – ulula.
Em casa, adeptos do sofá, engasgam a sopa e comandam silêncio à garotada. Adolescentes partilham a vibração do ecrã. Talvez cachecóis poeirentos agitados entre a garfada da janta e o livre de Carlos Martins. Apita ou não o Malquerença («diacho» de nome!)?
Amanhã é outro dia, mas quem dele quer saber quando a Taça da Liga é despique? Atira o relator de serviço;
- “Di Maria endiabrado. Joga para o Mundial.”
Ramirez, goooooooooooooolo! Dois a zero. Liedson, o «levezinho», enfia o terceiro. Goooooooooooooolo! Dois a um.
Desliguei o ligado. Como testemunha dou, superstição comezinha, má sorte ao clube preferência. Soando matinas, é conhecido o resultado, «recomentado» e requentado. Engavetado, o cachecol/herança não saiu. Cetim preto debruado a encarnado, sim. Macio, sobre a pele, foi melhor que muitos a um.
CAFÉ DA MANHÃ
Jennifer Janesko
Que saiba, nenhum dos meus amigos tenciona casar. Que saiba, e porque a minha leitura das revistas cor-de-rosa se limita a desfastio no cabeleireiro, notáveis reais ou de faz-de-conta também não contraíram núpcias. Aliás, o entretém de ver bonecos nos pomposos hairstyles é frequentemente impossível _ unhas pintadas de fresco, arrepelões do cabelo deixam-me com disposição canina. Sem paciência para nada além do “tirem-me daqui!”.
Ontem, foram a enterrar dois nomes/instituições com prestígio planetário. Sobre o do Michael, depois reduzido a cinzas, não escreverei mais do que isto. Os fãs que vertam lágrimas e se encarreguem de construir o inevitável mito – quem morre cedo e é famoso arrisca-se a perpétuos festins nostálgicos. O último desfile de Christian Lacroix é funeral de uma casa de alta-costura que durante vinte anos enfeitiçou inúmeras mulheres e menos homens _ pagar a factura de entusiasmo caro da parceira não deixa boa memória.
Duas centenas de privilegiados assistiram à apresentação da última colecção. No caso, Outono/Inverno. “Como um esboço, como um desenho prévio da pintura", disse Christian Lacroix. Convite preto e cinza de acordo com o luto pela casa que fenece se nenhum comprador surgir até final de Julho. Manequins desfilaram à borla. As jóias que as enfeitaram foram emprestadas por amiga rica do criador de moda. Dos 125 funcionários, as costureiras há muito não recebem paga.
As dificuldades que a Maison Lacroix experimenta devem-se, parcialmente, ao facto do estilista/artista ter recusado transformar a sua obra artesanal numa simples marca produzida nos confins do mundo. Renegou os logotipos impressos, a facilidade duma griffe passível de contrafacção vendida nos outlets e feiras. Quem do sonho não desiste, arrisca o pescoço. Aconteceu. De novo.
Mas Christian Lacroix luta. Incansável, sopra as brasas para que não seja perdida a chama de luxo e glamour da alta costura francesa que assina.
CAFÉ DA MANHÃ
Four Weddings And A Funeral
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros