Quarta-feira, 23 de Abril de 2014

FALTAM 2 DIAS PARA 40 ANOS

                    

João Abel Manta - A Família dos Pachecos                                                                               João Abel Manta - Namoro

 

Era um país a preto e branco. Havia o bem e o mal. A virtude e o pecado. O permitido e o proibido. Pessoas certas e erradas - comunistas, ladrões, democratas, assassinos, livres pensadores, trafulhas, irreverentes, prostitutas, liberais, bêbados, artistas ousados, ateus. Somente na riqueza havia três categorias: muito ricos, remediados e pobres (a maioria). Era um país de filtros. Uniformes nos níveis de porosidade, passava o situacionista e ficava retido o perigoso cruzado a vermelho pelos censores. Os humores e a tacanhez dos polícias do espírito filtravam a informação, os livros, os filmes, a música e o teatro. Era um país de famílias: as poderosas e as outras. Mas famílias. Pai, mãe e filhos, ascendentes e descendentes, todos com estado civil nos vértices de um triângulo: viúvos, casados ou solteiros. Estes como pessoas menores sendo adultos e mulheres. Uma depressão no feminino - doença dos nervos, diziam - podia ter uma de duas razões: pesadas mágoas se casada, falta de homem se solteirona (estado avançado da degradação das mulheres que ninguém quis). Era um país de homens. Governavam o povo e as famílias, detinham os cargos superiores, pertencia-lhes a exclusividade da vida militar e doutras profissões. Era um país analfabeto, rural, com elevada mortalidade infantil, pejado de deveres e diminuído em direitos, salvo a bebedeira, o prostíbulo e o futebol. Era um país sem dúvidas. Do nascer ao morrer. Acabada a primária, era sabido que, podendo a família sustentar estudos, o destino seria a Escola Industrial ou o elitista Liceu. Os meninos pobres para se instruírem iam para o seminário, enquanto as meninas pobres faziam a lida da casa, trabalhavam nas fábricas ou no campo. O rapaz sabia que a guerra o esperava no alvor da juventude e, caso sobrevivesse, no regresso empregava-se e constituía família. As raparigas casavam cedo para amarem e procriarem com decência; trabalho fora de casa apenas por necessidade ou capricho da abastança. As mulheres eram velhas aos quarenta anos. Havia a certeza da morte ser precedida pelo chamar do padre e pela extrema unção – caso contrário, iam direitos ao Inferno e a família incorria em grave risco de escândalo social perpetuado até à terceira geração. Portugal legitimou dúvidas, opiniões e deu-lhes voz sem medos faltam dois dias para quarenta anos. Bem maior não há.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:26
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Terça-feira, 2 de Julho de 2013

VAI UMA REZA PELO MORIBUNDO?

 

LA Hughes watercolor collage “To Die For”                                                    LA Hughes Pop painting “Go Forth…”

 

A pasta das finanças mudou de rosto e de mãos. É o costume: quando é chegada a condição de moribundo, ou se desligam as máquinas de suporte de vida, ou é tentado remédio novo ainda sem créditos firmados e que pode dar o golpe final no desgraçado. Para os crentes é altura de pedir conselhos à Senhora de Fátima como o patrão maior fez há tempo pouco.

 

Vem a propósito a letra da música “O Charlatão” a que o Sérgio Godinho deu voz.

 

“Numa ruela de má fama
faz negócio um charlatão
vende perfumes de lama
anéis de ouro a um tostão
enriquece o charlatão

 

No beco mal afamado
as mulheres não têm marido
um está preso, outro é soldado
um está morto e outro f´rido
e outro em França anda perdido

 

É entrar, senhorias
a ver o que cá se lavra
sete ratos, três enguias
uma cabra abracadabra

 

Na ruela de má fama
o charlatão vive à larga
chegam-lhe toda a semana
em camionetas de carga
rezas doces, paga amarga

 

No beco dos mal-fadados
os catraios passam fome
têm os dentes enterrados
no pão que ninguém mais come
os catraios passam fome

 

É entrar, senhorias
a ver o que cá se lavra
sete ratos, três enguias
uma cabra abracadabra

 

Na travessa dos defuntos
charlatões e charlatonas
discutem dos seus assuntos
repartem-se em quatro zonas
instalados em poltronas

 

P´rá rua saem toupeiras
entra o frio nos buracos
dorme a gente nas soleiras
das casas feitas em cacos
em troca de alguns patacos

 

É entrar, senhorias
a ver o que cá se lavra
sete ratos, três enguias
uma cabra abracadabra

 

Entre a rua e o país
vai o passo de um anão
vai o rei que ninguém quis
vai o tiro dum canhão
e o trono é do charlatão (bis)

 

É entrar, senhorias
a ver o que cá se lavra
sete ratos, três enguias
uma cabra abracadabra”

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 07:09
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Sábado, 18 de Maio de 2013

10 MEDIDAS PARA OBTER O DOMÍNIO SOCIAL

 

Jim Todd

1 - A estratégia da diversão

Elemento primordial do controle social, a estratégia da diversão consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e da mutações decididas pelas elites políticas e económicas, graças a um dilúvio contínuo de distrações e informações insignificantes.

"Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por assuntos sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar, voltado para a manjedoura com os outros animais" (extraído de "Armas silenciosas para guerras tranquilas" )


2 - Criar problemas, depois oferecer soluções

Este método também é denominado "problema-reação-solução". Primeiro cria-se um problema, uma "situação" destinada a suscitar uma certa reação do público, a fim de que seja ele próprio a exigir as medidas que se deseja fazê-lo aceitar. Exemplo: deixar desenvolver-se a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público passe a reivindicar leis securitárias em detrimento da liberdade. Ou ainda: criar uma crise económica para fazer como um mal necessário o recuo dos direitos sociais e desmantelamento dos serviços públicos.


3 - A estratégia do esbatimento

Para fazer aceitar uma medida inaceitável, basta aplicá-la progressivamente, de forma gradual, ao longo de 10 anos. Foi deste modo que condições socioeconómicas radicalmente novas foram impostas durante os anos 1980 e 1990. Desemprego maciço, precariedade, flexibilidade, deslocalizações, salários que já não asseguram um rendimento decente, tantas mudanças que teriam provocado uma revolução se houvessem sido aplicadas brutalmente.

4 - A estratégia do diferimento

Outro modo de fazer aceitar uma decisão impopular é apresentá-la como "dolorosa mas necessária", obtendo o acordo do público no presente para uma aplicação no futuro. É sempre mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro porque a dor não será sofrida de repente. A seguir, porque o público tem sempre a tendência de esperar ingenuamente que "tudo irá melhor amanhã" e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Finalmente, porque isto dá tempo ao público para se habituar à ideia da mudança e aceitá-la com resignação quando chegar o momento.

5 - Dirigir-se ao público como se fosse criança pequena


A maior parte das publicidades destinadas ao grande público utilizam um discurso, argumentos, personagens e um tom particularmente «infantilizadores», muitas vezes próximos do debilitante, como se o espectador fosse uma criança pequena ou um débil mental.

"Se se dirige a uma pessoa como ela tivesse 12 anos de idade, então, devido à sugestibilidade, ela terá, com uma certa probabilidade, uma resposta ou uma reação tão destituída de sentido crítico como a de uma pessoa de 12 anos". (cf. "Armas silenciosas para guerra tranquilas")


6 - Apelar antes ao emocional do que à reflexão

Apelar ao emocional é uma técnica clássica para «curtocircuitar» a análise racional e, portanto, o sentido crítico dos indivíduos. Além disso, a utilização do registo emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para ali implantar ideias, desejos, medos, pulsões ou comportamentos.

7 - Manter o público na ignorância e no disparate

Atuar de modo a que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para o seu controle e a sua escravidão.

"A qualidade da educação dada às classes inferiores deve ser da espécie mais pobre, de tal modo que o fosso da ignorância que isola as classes inferiores das classes superiores seja e permaneça incompreensível pelas classes inferiores". (cf. "Armas silenciosas para guerra tranquilas")

8 - Encorajar o público a comprazer-se na mediocridade

Encorajar o público a considerar "fixe" o facto de ser idiota, vulgar e inculto.

9 - Substituir a revolta pela culpabilidade

Fazer crer ao indivíduo que ele é o único responsável pela sua infelicidade, devido à insuficiência da sua inteligência, das suas capacidades ou dos seus esforços. Assim, ao invés de se revoltar contra o sistema económico, o indivíduo se auto-desvaloriza e auto-culpabiliza, o que engendra um estado depressivo que tem como um dos efeitos a inibição da ação. E sem ação, não há revolução!...

10 - Conhecer os indivíduos melhor do que eles se conhecem a si próprios

No decurso dos últimos 50 anos, os progressos fulgurantes da ciência cavaram um fosso crescente entre os conhecimentos do público e aqueles possuídos e utilizados pelas elites dirigentes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o "sistema" chegou a um conhecimento avançado do ser humano, tanto física como psicologicamente. O sistema conhece melhor o indivíduo médio do que este se conhece a si próprio. Isto significa que na maioria dos casos o sistema detém um maior controlo e um maior poder sobre os indivíduos do que os próprios indivíduos.

 

Sylvain Timsit

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 09:33
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Domingo, 16 de Outubro de 2011

PRIVATIZAM A ÁGUA, NACIONALIZAM A SEDE

 

 

 

 

 

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:36
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Quarta-feira, 17 de Agosto de 2011

EM 1946, MARIA E SARIO

Donato Giancola e autor que não foi possível identificar

 

No concelho de Gouveia, como noutros das Beiras, década de quarenta e par das seguintes, acabada a instrução primária dos afortunados que ‘iam à escola’, as crianças ajudavam ao sustento da família por mor da pobreza extrema. Iniciadas na lavoura, na pastorícia, na lida da casa, na costura, carregavam cântaros de água sobre as cabecitas, alimentavam o porco e bichos de capoeira, do ferro de brasas sabiam o manejo na arte de engomar. Calejavam os pés andando descalças ou, arribado o frio, com sorte, talvez protegidos por tamancos e peúgas saídas de mãos laboriosas no tricô.

 

Porque Gouveia era centro importante no fabrico e exportação de lanifícios, quem podia trabalhava nas fábricas. Frequente, ‘meter pedido’ para conseguir admissão e combinar fábrica com agricultura de subsistência ou jorna ao serviço doutrem. Na indústria fabril, o trabalho era por turnos. Aos dez anos, fizesse neve ou sol, pela madrugada, saíam das camas ou do que dela fizesse as vezes para fazer a marmita e andarem quilómetros – pegavam às oito. No final do dia, a paga era dezena de tostões. Se no Inverno percorrer a distância era sofrimento indizível pelo frio de navalha da montanha, mãos e pés atiçados por frieiras, na fábrica continuava o Inferno: barulho ensurdecedor, homens negros pelos óleos, correias espalhadas, catraios empoleirados em bancos, não chegando aos teares. Ao meio-dia, estrondeava apito para o intervalo da bucha/almoço comida dentro da fábrica, em redor de bidons onde ardia lenha que (mal) disfarçava o gelo nos ossos.

 

Em 1946, na “Belino”, é iniciada paragem laboral – finalmente, acontecia greve devida às desumanas condições de trabalho e aos magros salários. “Nas Amarantes”, uma das fábricas mais importantes do país com setecentos trabalhadores, o mesmo. Mal passada era uma hora, a GNR cerca as unidades fabris, empurram para dentro dos jipes e prendem cerca duma quinzena de homens julgados cabecilhas. O pai da menina que com o filho do sacristão escondera os coxins dos prie-dieu na igreja das Aldeias trabalhava na “Sociedade Industrial”, comummente designada por “Amarantes”.

 

Estando no colégio a já adolescente, ouve contar o que acontecia. Juntamente com o Sario cujo pai era operário na mesma fábrica saem desvairados das aulas e, numa corrida, alcançam a praça de S. Pedro onde guardas, jipes com os presos e multidão se haviam ajuntado. Espreitavam os detidos temendo encontrarem os pais. Saberiam, então, que eles permaneciam dentro da fábrica - ao primeiro, um dos fundadores do sindicato na região que, de pronto, se identificou com a luta, salvara-o a ascendência familiar, isto descobriria mais tarde, ao segundo, a óbvia inocência.

 

Mais tranquilos, correram de volta ao colégio. À entrada, dão com o director que os esperava. Apopléctico de fúria, aos brados indaga porquê o desplante de faltarem a uma aula. O Sario adianta-se e explica a angústia que haviam passado. Sem delongas, o director dá sonora bofetada ao rapaz com dezasseis anos. A Maria, ferida pela incompreensão e violência, questiona-o:

_ “Porque não me bate também? Por ser mulher e sobrinha dum padre?”

 

Durante quinze dias, as fábricas mantiveram portas cerradas enquanto os patrões reuniam e ruminavam procedimentos. Aos poucos, chamaram operários. Admitidos os imprescindíveis pela função especializada e os considerados rebanho cordato.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 09:53
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Segunda-feira, 18 de Janeiro de 2010

DO “BOTEQUIM” AO “PEQUENO HERÓI”

Autor que não foi possível identificar

 

É utópico. Poeta. Vive e tem parca/polémica recompensa dos ideais que o fluir dos anos(trans)tornaram em atitudes desligadas do real. Analisa o redor, facto, com filtro de poros largos. Dele o desfasamento sentido pelos concidadãos. É pau na engrenagem poderosa/ política que o teme e nele manifesta descrença como candidato a Belém. Divide em dois o PS. Jaime Gama como putativa opção geradora de maior consenso.

 

Manuel Alegre de nome, sobrevivente de idos onde pontificaram Natália Correia, José-Luís Ferreira, querido amigo, Vera Lagoa e Helena Roseta entre outros muitos. O Botequim, sito no Largo da Graça, em Lisboa, foi lugar de tertúlia onde as partes/pessoas eram figuras principais. Hoje, transformado na livraria infantil “O Pequeno Herói". Mas quem lembra a mesa do fundo, altar ou tribuna onde os notáveis tomavam assento, retém memórias e estórias que a História não deve esquecer.

 

Manuel Alegre jamais será o meu candidato presidencial. Cavaco também não – odeio pragmatismos servidos gelados. Cito Jorge Sampaio – “há mais vida além do défice!”. Da coisa/«crise» também. O povo, ignoto como eu, confirma-o.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

Tema ouvido pela vez primeira com Manuel Maria Carrilho quando, no melhor tempo dele segundo análise subjectiva - a minha -, em vez da farda intelectual preta e branca, usava ganga e camisa «vaiela» com quadrados.

 

 

publicado por Maria Brojo às 06:11
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