Jinchul Kim
O Fernando Nunes Vicente refletiu, de modo leve e agradável, sobre um estudo inquietante do qual cito a parte sumarenta: “as meninas que em pequenas se deliciaram com os contos de fadas têm mais possibilidades de virem a ser maltratadas em adultas.” Direi, dando préstimo a termos ali adquiridos, que a revisão da «atitude textual» relativa aos contos de fadas não é nova. Desde há trinta anos que as histórias de princesas compassivas, pele branca, olhos azuis e lábios de rubi têm sido chicoteadas. Não à toa, pese embora a dívida de gratidão pela doçura dos sonos e sonhos da infância.
No anterior blog alinhei ideias sobre as representações subjacentes a tanta princesa adormecida, gatas borralheiras passivas e «rapunzeis» pacientes. A escandalosa complacência das vítimas perante bruxas e madrastas opressoras, príncipes ou monstros que o amor transfigurava, não podia ser bom presságio para meninas embaladas em partes iguais por fadas, biberões e papas lácteas. Tinha de dar no que deu - mulheres confinadas à subserviência face à família e aos ditames sociais.
Preocupante, é também o conceito, ainda hoje enraizado, de o que o amor transfigura quem toca. Beberrão, mulherengo, leviana, irresponsável, ou perverso, virará beatífico se tocado pela «varinha-de-condão» do amor. O pior é que muitas - mais elas que eles, convenhamos! - caem na ratoeira. _ “Ah, ele muda, verás, só precisa de uma oportunidade!” Uma, duas, três, «n» oportunidades. Gemem por volta da décima, quando a dor se sobrepôs ao orgulho. Aí, já as úlceras do espírito são mais profundas que as da carne.
CAFÉ DA MANHÃ
Contava como eram tratados os mexicanos pelos turistas norte-americanos: com desprezo. Julgavam não ser percebido o inglês falado quando o sarcasmo pelo povo que os recebia era, afinal, entendido. Humilhante. Lembranças de infância e juventude que viriam a determinar-lhe opções – jamais estar num país sem tentar perceber a língua nele falada. Cantou em checheno para crianças, algumas delas sobreviventes do massacre na escola de Beslan. Ali, em Setembro de 2004, a barbárie terrorista sacrificou, pela tortura e morte, crianças, pais e professores.
A beleza da sua voz melancólica e quente levá-la-ia a múltiplas partidas no mundo. Solidária, dizia não entender a palavra ‘inimigo’:
_ Pessoa é pessoa semelhante a quem a rotula pelo ódio, preconceito ou nação a que pertence.
Por isso, cantou em árabe melodia de amor, transversal a todas as sociedades, num concerto em Nova Iorque.
Amava a vida com paixão. Projectava ter filhos. O cancro na mama levou-a no primeiro dia do ano. Tinha 37 anos. Fica a voz gravada em três álbuns e o sentir de Lhasa de Sela:
_ “A música triste não me dá tristeza, mas alegria pela nostalgia que também é vida. Dela, retenho o contentamento.”
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros