Sexta-feira, 7 de Novembro de 2014

ROSAS ORVALHADAS

Ella Fournier, Robert M Baumbach

 

Nesta época de aniversários de «escorpiões» familiares que vivo – cinco no total -, hoje acontece mais um. Lembro «escorpião» memorável: Marie Curie. Fora a esperança de vida duplicada e não tivesse manuseado material radioactivo sem qualquer protecção - ao tempo, 1896, eram dados os primeiros passos na descoberta da nova energia – cumpriria o aniversário 147. Mas não, partiu com sessenta e seis anos devido à leucemia provocada pelo meritório trabalho iniciado com a pechblenda rica em urânio, o elemento natural com maior massa. Mereceu dois prémios Nobel: da Física partilhado com Pierre Curie, o marido, e com Henry Becquerel que a incentivara a pesquisar o que o urânio tinha para contar, e, oito anos depois, o da Química. Par de elementos químicos honrou-a através do nome de baptismo científico: o polónio, devido ao país natal de Marie, e o cúrio que pretendeu abranger Pierre Curie. É contado que ainda hoje todo o material de laboratório utilizado pelo casal nas investigações emite radiação em dose letal. Não que admire por ser longo o período de decaimento radioactivo.

 

A «escorpião» que muito amo e partilha data de aniversário bem como o nome com Marie (vertido para português), além de milhões de humanos, é mulher notável aos olhos de quem a conhece. O reconhecimento alheio não carece de grandes feitos que avancem as sociedades; a generosidade e o sorriso espontâneo que dela também é modo, a proteção de desvalidos com nome e rosto transformados em amigos/família conseguem permanência na memória dos próximos. E são rosas orvalhadas que lhe ofereço, colhidas antes do sol, guloso, as lamber.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

Fazem parte do ofertado duas das vozes que prefere e recordam o segundo nome que detém.

 

publicado por Maria Brojo às 08:30
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Segunda-feira, 14 de Janeiro de 2013

"LA ORGIA PERPETUA"

 

Leszek Sokol

 

“A única maneira de se suportar a existência consiste em deixar-se arrebatar pela leitura como se numa orgia perpétua”. Frase de Flaubert numa carta enviada a Mario Vargas Llosa que nela se inspiraria para dar título ao seu livro sobre Madame de Bovary, La Orgia Perpetua.

 

Tomando ‘orgia’ como escondido de culto divino, arredada a literalidade de devassidão, o enleio na leitura renova o mundo pessoal. Permite olhar vidas alheias tão reais quanto real for o desejo de erguer castelo único onde a vida se eleva. Ensina mais sobre os comportamentos do que procissão de quotidianos. Fomenta, não raro, amor pelos outros.

 

Engana-se quem julga isenta de riscos leitura intensa: desfasamento do real, dos esquissos circunspectos que famílias e sociedades desenham para o indivíduo. Questiona arranjos estabelecidos, regras cimeiras, seja Deus, o dia-a-dia, a família, a Igreja, governos, o arranjo cósmico. Quem manda sabe-o. Aniquila voos dos ideais. Metralha-os. Ou os abate, ou lhes cerceia proliferação. Como se maleita contagiosa requer vacina na forma de estrangulamentos inscritos em leis – a troça social tem efeito igualmente castrador.

 

Leszek Sokol

 

Virgínia Woolf coincidia no pensar que talvez e somente Deus fosse benevolente com os leitores viciados em literatura. Escreveu:

“Também eu já por vezes sonhei que quando vier o dia do Juízo Final e os grandes conquistadores e advogados e estadistas vierem receber as suas recompensas – as suas coroas, os seus louros, os seus nomes indelevelmente cinzelados sobre o imperecível mármore -, o Todo-Poderoso virar-se-á então para Pedro e dirá, não sem uma ponta de inveja, quando nos vir chegar com os nossos livros debaixo do braço: «Olha, estes não precisam de recompensa. Nada temos para lhes dar aqui. Eles amavam a leitura.»”

 

Leszek Sokol

 

Porém, haja cuidados antes do «Final». Existe caricatura onde uma ama puxa carrinho de bebé enquanto lê. De tão imersa na leitura, nem repara que há muito o bebé caiu. Semelhante com Bluma Lennon. Havia acabado de comprar um livro de Emily Dickinson. Não resistiu à curiosidade e, de imediato, começou a lê-lo alheada das cercanias. Ao atravessar rua, um carro atropelou-a. O mesmo fim de Pierre Curie, Nobel da Física que em 1903 partilhou com a mulher, Marie. Pela tempestade na hora, não consta que lesse ao sair de um almoço na Associação de Professores da Faculdade de Ciências – pensava quiçá no feito e por fazer, no lido e no escrito. Na rua Dauphine, carruagem matou-o instantaneamente. Salvou-o de agonia lenta pela radioatividade do material de trabalho como aconteceria com a sua amada Marie Curie.

 

Ler e pensar podem ser perigosos. Honrados sejam os não timoratos de vícios estes. E vem lugar-comum: “O que sabe bem ou é pecado ou mata.” Pela leitura morte é rara e o pecado não bate assim.

 

Nota: há instantes, texto publicado aqui

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:31
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