Paul John Ballard
A Bita. No ecrã, origem desconhecida; pela hora, certa a origem. Por isso atendeu – de costume, recusava ‘anónimo’. Voz grave. Desconcerto para quem lhe conhecia o saltitar alegre do “A menina como está?”. Intervalava fala com risos. Partilhas que o relógio esquecia ou comprimia sendo imposta crueza normativa do trabalho. Mas fora o “Bom dia!” esquecido e a fatalidade esgueirada sem fios que cavaram sulcos preocupados. Do “que aconteceu?” teve resposta:
_ Partiu-me o pulso!
Silêncio. Interrompeu-o. Quis saber mais do que sabia: a partilha, tensa como funda esticada e pedra na ponta, da casa de família com o futuro ex-marido dentro. Os filhos testemunhas e vítimas da agonia conjugal. Das perfídias. Das réplicas violentas. Da agressão mútua. Psicológica até ao momento.
_ Cheguei do hospital, engessada, mas sem dores. Foi quando saía de casa para as compras de sábado. Puxou-me. Tentei escapar. Agarrada, torceu-me o pulso até o sentir ranger. Os miúdos ainda dormiam. Eu, só. Fugi, chamei um táxi e fui para São Francisco Xavier.
O tom monocórdico respirava anestesia.
_ Estou bem.
Sem lágrimas, soube da polícia que a acompanhara desde a entrada na urgência. Do remedeio clínico, da ida à esquadra, do auto lavrado, do regresso na viatura policial. E as lágrimas e as palavras que não iam nem vinham. _ Vou dormir. Tenho os meus pais comigo. Se precisar ligo, querida.
Dos dias, gostava todos. A cada um, surpresa. Mas era sábado. Previsíveis seriam remansos, acordares quentes, mãos com tempo para a pele. Amor no sumo de laranja fresco na mesa. Talvez feito da paixão arredada da Bita, mas que dera filhos e anos, pela memória não inscritos no rol do haver bom.
CAFÉ DA MANHÃ
Cortesia de Açúcar C..
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros