Paul John Ballard
“Essas miúdas das escolas secundárias
Com cheiro a leite e o soquete pelo artelho
Ficam maradas com o teu charme perfumado, Yeah
O teu perfume patchouli”
Exibi o tornozelo acima das soquettes. Foi meu o aroma da inocência. «Marei» com o cheiro dos livros novos e o charme de rapazes. Usei os livros presos em correias. Como menina de bom-tom, discretamente enviesei o olhar quando uma «brasa» me queimava o passar. Aprendi a (des)controlar a exígua liberdade. Aprendi a gostar de aprender. Irreverente, ousei o (im)possível no clube de rádio do Liceu – inundar corredores e pátios como o Je t'aime moi non plus. Velho na altura, propício à descoberta dos sentidos. Porém, não recordo a embriaguez do patchouli.
“Essas miúdas das escolas secundárias
Já fumam ganzas na paragem do eléctrico
Conversas parvas com mais buço que pintelho
Não dizem duas quando estão ao pé de ti”
Passarinhei em bando de miúdas tagarelas. Usei saias kilt, minis e ultra minis, hot pants com botas de verniz presas por fivela acima do joelho. Falhei as «ganzas», o eléctrico e autocarros – mediando curta distância entre a escola e a casa, caminhei nas manhãs frias, gozei o mistério dos nevoeiros; pingos de chuva escorreram nos meus cabelos soltos e no rosto. Tive conversas parvas, algumas intelectualmente pretensiosas. Não dizia «duas» nas festas de garagem ou nas do clube frequentado pelos pais e famílias amigas. Mal sabia dançar enlaçada, e, quando numas férias em Gouveia, o primeiro delico-doce pousou, demorando, os lábios na minha mão que apertava, esfreguei-a tomando o afago por inoportuna coceira. Mas reforcei no Liceu, depois Escola Secundária, a curiosidade. Mais que rol de conteúdos e conceitos e mnemónicas e fórmulas, ensinaram-me o gozo da descoberta. Afrontar dificuldades. Sentir o aguilhão do erro. Olear a engrenagem racional. Não fugir a desafios, sendo eu a adversária. Fui miúda banal que falhou as «ganzas» e o patchouli.
Nota - reposição modificada de texto com anos.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros