Sexta-feira, 17 de Janeiro de 2014

DONA ROSA

 

 

Vladimir Kush – Forgotten Sunglasses

 
Já não há porteiras. De mansinho, uma aqui, outra ali, mais uma «acoli», foram desaparecendo. Arrumaram os «tarecos» para gozo da reforma _ “perto da minha Arminda, que, não desfazendo, também é muito boa filha, assim como a menina, benza-a Deus!” _ ou convidadas pelo chefe anual dos condóminos a largar o ofício a troco da permanência na casa por uns anos mais. Delas ficou o vazio do “bom dia! Está atrasada... Eu chamo o elevador enquanto aperta o casaco. Dê cá a pasta, «menina»”, sem arredar a mão da esfregona ao suster  a porta do elevador.

As porteiras de bairro, quais babushkas de São Petersburgo ou Vladivostok, eram guardiãs dos costumes encavalitados nos conformes sociais, informadoras, conhecedoras de todos os truques da sobrevivência humana, especialistas em fintarem quem julgava ludibriá-las. A menina Ivone do 4º esquerdo que, havia anos, deixara os quarenta para trás e nunca casou, bem podia, noite alta, manter as luzes apagadas ao sair o colega do escritório, e sussurrar-lhe: _ “Vai pelas escadas e não batas a porta de baixo.”” Ou a pequena do terceiro aveludando as botas ao dispensar o elevador se era alta a madrugada no entra em casa. A todos a Dona Rosa topava as cautelas das quais lhes prestava conta por via de indirectas certeiras _ “A menina veja lá, suba como deve ser, não seja preciso uma noite destas chamar o 112 por mor de alguma queda...” Ou o Doutor Figueira, despachado pela meia-noite da última «doente» no consultório, ainda transpirando vitalidade por todos os poros ao regressar noite adiante ao «lar» _ “Quando o doutor chega assim tarde, nada como um duche para limpar o perfume, ai o meu disparate!, as ideias.””

Não há segurança encorpado, a farda como envelope/endereço de condomínio fechado, prestimoso ao arranjar a porta-janela da cozinha que não fecha, o estendal no recanto do «combinado», o silicone pasmado dos cabos serpenteando no chão que me faça esquecer a D. Rosa, barriga à solta empinada sob a bata de quadrados. Ou os seus olhos piscos de ironia ao comentar: _ “Pérolas, saia e casaco?! Hoje, chegam os paizinhos, não é?”

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:00
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Quinta-feira, 3 de Novembro de 2011

DONA ROSA

Barbara Silbert

 
Já não há porteiras. De mansinho, uma aqui, outra ali, mais uma acoli, foram desaparecendo, arrumaram os «tarecos» para gozo da reforma _ “perto da minha Arminda, que, não desfazendo, também é muito boa filha, assim como a menina, benza-a Deus!” _ ou convidadas pelo chefe anual dos condóminos a largar o ofício por troco da permanência na casa uns anos mais. Delas ficou o vazio do “bom dia! Está atrasada... Eu chamo o elevador enquanto aperta o casaco. Dê cá a pasta, «menina»”, sem arredar a mão da esfregona ao «prender» a porta do elevador.

As porteiras de bairro, quais babushkas* de São Petersburgo ou Vladivostok, eram guardiãs dos costumes encavalitados nos conformes sociais, informadoras, conhecedoras de todos os truques da sobrevivência humana, especialistas em fintarem quem julgava ludibriá-las. A menina Ivone do 4º esquerdo que havia anos deixara os quarenta para trás e nunca casou, bem podia, noite alta, manter as luzes apagadas ao sair o colega do escritório, e sussurrar: _ “Vai pelas escadas e não batas a porta de baixo.” Ou a pequena do terceiro aveludando as botas ao dispensar o elevador se era alta a madrugada ao entrar em casa. A todos topava as cautelas das quais lhes prestava conta por via de indirectas certeiras _ “A menina veja lá, suba como deve ser não seja preciso uma noite destas chamar o 112 por mor de alguma queda...” Ou o Doutor Figueira, despachado pela meia-noite da última «doente» no consultório, ainda transpirando vitalidade por todos os poros ao regressar tardiamente ao «lar» _ “Quando o doutor chega assim tardego, nada como um duche para limpar o perfume, ai, que disparate o meu!, as ideias.””

Não há segurança encorpado, a farda como envelope, prestimoso ao arranjar a porta-janela da cozinha que não fechava, o estendal no recanto do «combinado», o silicone pasmado dos cabos serpenteando no chão que me faça esquecer a D. Rosa, barriga empinada, à solta sob a bata de quadrados. Ou os seus olhos piscos de ironia ao comentar: _ “Pérolas, saia e casaco?! Hoje, chegam os paizinhos, não é?”

 

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CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 10:36
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Olá. Posso falar consigo sobre a sua tia Irmã Mar...
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