Quarta-feira, 31 de Agosto de 2011

ENTRE OS ‘DE LÁ’ E ‘OS DE CÁ’, ‘ALMINHAS’

Pat Durgin

 

À freguesia de Aldeias pertence São Cosmado e Alrote, respectivamente ‘povo de cá’ e ‘povo de lá’. Neste, havia somente capela, maior pobreza, menos população, embora aguerrida. ‘No de cá’, tinham casa famílias de nomeada com direito a solares ocupados quando Setembro chegava: o do Dr. Pedro e o do Dr. Raul. Do primeiro, o tio-bisavô padre Alberto Brojo, homem culto, foi capelão como anteriormente sucedera com os marqueses de Gouveia. Era o tempo da influência da Igreja Católica junto das gentes, fossem de última ou primeira água na hierarquia social. Era o tempo dos apelidos sonantes que serviam de cartão de visita e conferiam primazias várias a quem deles o notário oficializava o uso. As meninas Brojo, pertença da quarta geração anterior à actual, muito fruíram dos inúmeros salões, quartos, pianos e fantasmas inventados pela Carmo Isabel quando pretendia assustar as primas. Postada na base da escadaria de pedra que subia até à escuridão do sobrado, gritava:

_ Foge Rosinha, que vem aí a Ema!

E a benjamim das mais recuadas meninas Brojo, quando adulta bonita mulher que pêlos no queixo não desfeavam, fugia a sete pés tomada de pânico, não vislumbrasse da Ema, antepassada dos da casa, a caveira sob o manto/lençol branco.

 

As relações entre os habitantes ‘de cá’ e ‘de lá’ primavam por rivalidades. O povo de São Cosmado não interferia com o de Alrote salvo quando provocado. E era-o vezes algumas, também nas festas votivas: Nossa Senhora da Conceição e o mártir São Sebastião, lá, São Cosme e São Damião, cá. Eram discutidas com minudência as imponências das procissões, quantos anjinhos e andores, o comprimento das carreiras de gente atrás do padre e à frente da ‘música’ (banda filarmónica contratada), o andamento a compasso. Noutros momentos, não raros, junto às ‘alminhas’ que nos dizeres antigos eram separador geográfico dos povos, confrontos à paulada entre raivosos e divertidos garantiam falatório nos dois lados por muito e bom tempo chegado ao hoje por via da tradição oral. Para não acicatar o espírito conflituoso, a mais velha das meninas Brojo ao falecer com oitenta e muitos, teve de esperar no esquife, junto ao adro da Igreja de São Cosmado, antes de lhe ser permitida entrada no lugar abençoado por não estar acabada a missa que culminava, de Alrote, a festa da Nossa Senhora da Conceição.

 

Em idos, na passagem pelas ‘alminhas’ - bloco de granito com cruz esculpida e enfeitado por flores anónimas - tudo podia acontecer: orações com lágrimas, ataques de surpresa aos rivais ‘de cá’ que ‘para lá’ iam por amores ou obrigação. Bem pensou e melhor fez um de Alrote, enciumado por serenata a moçoila que dele era a luz dos olhos. Escondido atrás do bloco, ouviu do passante concorrente:

_ Adeus ‘alminhas’!

Retorquiu:

_ Adeus ó bêbado!

E o romântico movido a etanol por ali quedou pasmo, esquecido do objectivo.

_ «Atão» falais agora sem nunca antes me teres dado as boas noites? Pró catano convosco!

Amofinado, não passou adiante.

 

CAFÉ DA MANHÃ

 

publicado por Maria Brojo às 08:19
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