Ben Long, Boris Vallejo
Pediu-lhe ajuda nas compras semanais. Por resposta escusa frívola. Foi sozinha, como tantas vezes outras. Demais. Encheu o rodas até transbordar. Cinco carregos implícitos: da prateleira para o carrinho, deste para o tapete da caixa, depois para o automóvel, para o elevador, após, do hall comum para casa. Ele não estava.
Pela sobrecarga, sentiu dor no pulso direito, ombro acima em rota descendente - era dextra abusadora da condição. Arrastou os sacos para a cozinha, fechou a porta da entrada e, como se fosse dia sétimo, descansou instantes. Enquanto bebericava chá verde e frio sentada em frente da janela ampla que emoldurava colina sem construção, sentiu-se menor. Meditou nas razões: à custa de paz falsa, suportava em silêncio a revolta pelo carinho medíocre, ausência de partilha das emoções, por lhe caberem tarefas pesadas e solitárias que deviam ser comuns, pelo sexo e rotina pobres. Raras vezes verbalizados os factos por conduzirem a diálogos estéreis quea fatigavam. Sem coragem para confrontamentos decisivos que perigrassem a alternativa da conjugalidade obtida – outras diriam mais-valia no tempo de ‘homem a tiracolo’ para mulher ser -, desiludida pelos antecedentes de ‘cama, sim, compromissos, nunca’, submetera-se. Reconhecia o erro seu. Vivia a conformação.
Ele fora paixão. No presente, amor e amante vago. Deu por si desinstalada num relacionamento com alicerces de junco. Ela tão frágil como eles. Deixou os sacos cheios pejando meia cozinha. Bateu com força a porta. Saiu.
Faria insistentes pedidos de «volta-atrás». Ela que não. Regressou, com pré-aviso, para retirar pertences. Não lhe fizeram mossa as tentativas dele conciliar o impossível: a necessidade confortável que para o homem era, a consciência do mais querer bem cheia no peito dela. Caminho solitário? _ Talvez. Sexo de ocasião ditado pelo apetite? _ Sim. Noites desempecilhadas na cama exclusiva? _ Venham muitas! Preferíveis a amores de faz-de-conta afastados do âmago da mulher.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros