Barbara Cole
Ela admirava-o havia anos. Distantes nas áreas pedagógicas. Humor corrosivo o dele, dela a diplomacia, cigarros e falas nos intervalos sempre curtos demais. Ele casado, ela numa relação com pra cima de dezenas d’anos. Ele com filhos, ela também. Nunca vinham à fala intimidades nos precários minutos dos intervalos entre aulas. Virados para o Sol de Inverno, ou protegidos da soalheira estival pelas árvores raquíticas na Rodrigo da Fonseca. Em grupo, quase sempre. Olhares revelando o indizível. Silêncios faladores. Cigarros como pretexto do cala corações. Mas diziam. Medos e contenção no digo/não digo. E era o não dito a mais-valia. Incertezas dum lado e doutro. Omissos dizeres frontais.
Foi precisa manhã de Inverno para o oculto ver luz. E viu. E comoveu. E verdades subiram à tona com anos de atraso ou não – a vida aconteceu no momento próprio do acontecer. Comunicaram. Expostas almas. Afinal, ele estava divorciado havia trindade d’anos. Ela sem saber. Emoções sobrenadaram. O par com elas. Futuro? _ Interessa? O momento vale e as vidas jogam-se na sorte ou dela pouca.
CAFÉ DA MANHÃ
Malin Grön
Nos pequenos aldeamentos rurais, o Presidente da Junta é autoridade que muito importa aos moradores e suscita respeito assim cumpra com dignidade as funções. É o caso na aldeia onde moradia do princípio do século resiste aos ventos e geadas e trovoadas e nevões que pintam de alvura o visível.
Num domingo, O Sr. Mário, personagem descrita atrás, cruzou o Sr. Presidente enquanto bebericava o café pós-almoço acompanhado pela mulher. Fino como alho, não esqueceu a urbana Maria, regressada em cada Agosto, para quem trabalha mais por amizade de anos que por interesse na paga.
_ Ó Sr. Presidente, sei que às Juntas não sobram cêntimos. Será que a Câmara não colabora por via de máquinas e é alargado o caminho público que serve propriedades, entre elas, a da Doutora Maria? De mau carreiro, somente trezentos metros até á quinta da senhora. Beneficia ela e quem o lado direito cultiva.
_ Olhe que a lembrança vem a propósito: a Junta acabou de receber umas migalhas tendo como destino prioritário os caminhos públicos. Peça o Mário autorização à dona que bem conheço e cuja família prestou bons serviços à aldeia. Não esqueça que as máquinas vão comer pedaço duma borda da propriedade. Do resto encarrego-me.
O Sr. Mário, mais a Fátima*, companheira desde o nó abençoado, de pronto, arribaram à moradia na urbe. A designada ‘doutora Maria’ cirandava pelo jardim enchendo um balde com restos secos das podas. Acabara de estender máquina de roupa, que isto de fins-de-semana ausentam a Leonor*. Sentados no jardim à sombra duma latada, a boa nova encheu de alegria a Maria – há quase uma década que às sucessivas Juntas de Freguesia tinha sido feito idêntico pedido pelos homens da família. Sem sucesso na demanda, partiram e recebem agora velas acesas e flores nas campas. A cuidadora-mor* rejubilou por ela, pelos amores defuntos, pela família inteira.
Nos assentos cobertos pela latada de videiras mal cuidadas - ausências longas dão em desastre - Fátima, Maria e Mário comemoraram, comentaram a observação de coscuvilheira que podia ser figura vicentina. Olhando a Maria e o Sr. Mário descendo do Prado numa incursão de medidas, rezou assim:
_ Então, sempre em redor da casa? Bem precisa que olhe por ela. E tu, Mário, não trouxeste a Fátima para vos fazer companhia no ror de tempo que lá passaram?
* Personagens descritas anteriormente.
CAFÉ DA MANHÃ
Andrew Brusso
"De um modo assustadoramente banal, eles andam por aí. São os paineleiros, versão áudio e vídeo de uma certa sheet press, tablóide ou pink. Mulherezinhas em T2 horríveis, em ruas horríveis de bairros horríveis deslumbram-se com uma escrita de vómito. Ditos famosos mostram o cão, a sanita e a última peça de um amor agora é sério. Depois temos a versão culta, os paineleiros. Um bocadinho menos menos. Odeiam gravatas mas não prescindem de casaco. Riem-se muito, são amigos, e lêem jornais e livros em estrangeiro. Se são de direita dizem-se de esquerda e vice-versa enquanto anunciam desgraças eminentes. Não se sabe onde moram nem do que vivem, quando um vago ar de jornalista ou politólogo tudo cobre. E há ainda os crentes, os devotos do senhor presidente do concelho. Que defendem, novos cruzados de todas as virtudes. Esperam, talvez no céu dos ossos, que um dia sejam mais que presidentes de junta ou mais que subalternos VIP’s na sua pequena hora semanal de vaidade e fama.
A vida corre triste e essa gente é nada. Babujam o que já se sabe numa lama sórdida de croquete e refresco. Às vezes são advogados e maçons sem loja, redigem crónicas de viagens como se maçada fosse, atiram-se aos funcionários públicos como Jardim aos cubanos. Nos quiosques pululam notícias com foto da namorada da mãe que tinha um tio que disse ao primo que beijava a avó que matou o neto. E famosos de uma semana num concurso são autopsiados até ao limite do limite, no estertor da sua rua anónima.
A vida passa mal, e o lixo inunda as ruas e as paredes, quando latas de spray garatujam nomes e promessas de afecto."
Nota: para o SPNI, crónica de Fernando York.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros