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Setenta anos é obra. Nunca a frase esteve tão certa. E que obra...
Estávamos em 66, e o charmoso Henrique Mendes tinha ido ao Brasil e vinha fascinado com a marchinha “qui por lá se cantava". Orgulhoso de ter trazido a gravação para Portugal, passava-a vezes sem conta na Rádio num programa da altura. A qualidade técnica da coisa estava longe de ser boa mas o conteúdo agarrava e entrou no ouvido. Tornou-se rapidamente um êxito por cá atravessando "tanto mar... tanto mar".
Era o tempo das minhas descobertas. Primeiro, Elis Regina, depois Chico, Vinicius, tantos outros. Qual Cabral, também eu, na minha frágil casca de noz descobria o Brasil ou antes a sua música. Ainda hoje não fui lá. E no entanto, ele tem vindo até mim. Há poucos dias, aqui por casa, o casal divertia-se a relembrar músicas de outros tempos, algumas entre gargalhadas. E lá veio o "encosta a tua cabecinha no meu ombro e chora" e "será que sou feia? Não é não sinhô". Depois, chegou a vez da marchinha do Chico e vá lá de puxar pela cabeça mas o pessoal já não vai para novo. Não percebo porque se apregoa tanto a sabedoria que a idade traz quando ao mesmo tempo nos rouba o nome das coisas. Enfim, contradições. Entre muitos «lálás», lá fomos reconstruindo a letra que a música, essa, estava impecável e afinadinha.
Sempre gostei do Chico. Aqui estava apenas a começar. Do seu talento, da sua obra, dos seus olhos claros de oceano num rosto moreno que envelhece bem. Ao vivo, dois concertos apenas. Hoje, procurei o poema no Google. A esta distância, reparo que na subtileza das entrelinhas está ali tudo: a consciência social e política que aquele jovem já na altura semeava na música aparentemente ingénua que escrevia. Só os "poetas maiores" o conseguem. Lá como cá.
Parabéns Chico. Muitos anos de vida feliz.
Deve ser bom festejar a vida sabendo que passamos por ele deixando MARCA.
Deixo à minha doce parceira a tarefa de nos "trazer" a marchinha.
“Andava à toa na vida o meu amor me chamou pra ver a marcha passar cantando coisas de amor.”
NÃO É LINDO?
Texto escrito pela mui querida parceira ‘Era Uma Vez’
CAFÉ DA MANHÃ
Alphonse Mucha
«Sedução no feminino. Sem receita unívoca. Desabrochando à luz da ocasião.»
Vinícius que me desculpe, mas beleza não é fundamental.
Mulher sedutora é rodopio dos sentidos,
Seduzida por condição,
Espírito desenovelado,
Corpo solto.
Sensual desde o raiar da manhã;
Água que escorre pelas colinas alcantiladas,
Os vales e o sopé da vida
afagando as curvas de mulher.
Mulher sedutora precisa de amar.
Mais que ser amada, porque nos afetos é rainha.
Neles se sacia,
Deles nasce fome por mais e diferentes.
Pontes e gosto por travessias.
Ir além da margem dos outros.
Do regaço verter ternura como rosas,
Perfumando com elas os passos.
Seduzir um homem decorre do desejo pela vida.
Do gostar.
Do peito cheio,
Intumescido pelo colostro que sente latejar.
E que homem não confunda o gosto de gostar com paixão.
A sedução nem sempre (…)
Inspirado em “Receita de Mulher” de Vinicius de Moraes
CAFÉ DA MANHÃ
Ilaria Roberti
John Keats na "Ode a uma Urna Grega", escreveu:
Beleza é verdade, verdadeira beleza, - isso é tudo.
Sabeis na terra, e todos precisam saber.
Procuramos a beleza que se esgueira e cada um inventa. Num rosto, num perto ou num horizonte. Indiferentes aos critérios e cânones dos estudos que investigadores sobre a beleza fazem tese. Talvez os humanos lhes obedeçam e confirmem créditos à ciência que os gera.
Ou não.
Pela subtileza de traços discordantes que induzem fantasias, lábios cheios como os da Angelina Jolie são fascínio para muitos. Boca insubmissa às regras clássicas e outras graníticas nas normas.
O quê/muito da inocência que transparece da inquestionável beleza da Marilyn é a sensualidade abrangendo mitos sem tempo no tempo. De Eugénio de Andrade, no “Coração do Dia, Mar de Setembro”, a constatação:
Branco, branco e orvalhado
O tempo das crianças e dos álamos.
Eugénio de Andrade, na mesma obra, torna a escrever sobre fundos humanos. Servem como luva à beleza senhoril de Audrey Hepburn.
Mãe…
Na tua mão me levas,
Uma vez mais
Ao bosque onde me sento à tua sombra.
É contra a solidão
Que levanto o meu grito
Reclamando um rosto
Por sobre o vento
Um rosto no deserto
Uma água que não se escoe na areia.
Na precariedade,
Eu queria árvore que resistisse
Aos temporais de fim de Outono.
Nota: texto acabado de publicar aqui.
CAFÉ DA MANHÃ
Fabian Perez
Não me lembro da última vez que me maquilhei. Há três semanas, as unhas luziam com verniz, as mãos tiveram direito a massagem com creme, a pele do rosto tonificada à noite. O cabelo, infeliz, já nem deve recordar-se da máscara hidratante no final de escorrido o champô. Sobre pés e pernas devia ter vergonha - nem um pingo me aflige! - tantos são os arranhões por culpa de tojos e silvas, os hematomas por pancadas inadvertidas na pressa – vício que não desminto – de tudo fazer sem delongas.
Soando o clarim interior ainda o dia mal se espojou, começam rodopios na casa, de cima para baixo e seu contrário. O carrito anda num virote tal que nem faz sesta ou adormece na garagem; vale a latada do jardim que o abriga com a vantagem do portão da frente permitir maior ligeireza nas manobras. Desgraçadamente sujo, mais parece chapéu de pobre o que, de resto, anda próximo da verdade, merecendo, contudo, ser promovido a viatura de bombeiro pelos bons serviços nas urgências de recados e abastecimentos.
Ocasião para misturar óleos e preencher tela? Nem uma! Leitura apenas na cama enquanto o sono hesita ou em curto intervalo no pós prandiial em que é satisfeita a gula do corpo inteiro por Sol. E o reforço ‘inteiro’ traduz a mais límpida das verdades. Abençoada privacidade que liberta do inútil a pele…
Quem julgar queixumes de mulherzinha mal habituada o atrás contado, pois fique ciente de saborear a preceito cada pedacinho desta parte das férias. Chegam os demasiados meses em que arrebiques são precisos e algum tempo sobra para frivolidades. Neste lugar dos meus encantos que, uma vez ao ano, aproxima amores vivos, distantes, e protege raízes sólidas e ancestrais do psiquismo, respiro estar bem.
Aqui fica intenção que, por não ser de 1 de Janeiro sem ainda se ter despedido a ressaca das “Festas”, é para cumprir assim continue a ter amanhãs: _ Voltar e voltar, mês a mês.
CAFÉ DA MANHÃ
Imigrantes. Os nossos são heróis lá fora, os que chegam são perigo a evitar. E depois temo-nos por hospitaleiros, por cordatos, tolerantes, anti-racistas e ai de quem contradisser a canastra cheia de qualidades transportada na cabeça. O pregão soa nas ruelas e calçadas e bairros e urbes e aldeias. Porém, entrados num quiosque ou em qualquer loja/lojeca, atendimento com sotaque do Brasil, ou colorido por tom inesperado na pele, empina nariz português. Daí ao refúgio em conceitos primários é salto curto. As brasileiras são armadilhas ambulantes prontas a caçar homens amarrados ou não, brasileiros são madraços, negros acumulam preguiça com actividades mais escuras do que eles, indianos são sovinas com alvará e porta aberta, ciganos são gentalha à cata de borrascas e larápios como profissão, os de Leste corporativamente associados em máfias. Mas aqui d’el rei que os franceses são chauvinistas e não desistem de tomar a imigrante nossa por la petite portugaise que limpa escadas e o rabinho dos bebés autóctones.
Vista a Ludmila, Mila é diminutivo, ouvindo a brasileira da Baía, 19 anos, há dez em Portugal trazida pela família que entre Lisboa e a Margem Sul se fixou, é logro enquadrá-la na injustiça dos estereótipos. Trabalha para obter licenciatura em Nutricionismo. Discurso correcto e fluido. Sensato. Quem dera a muitos nacionais parecido domínio da língua portuguesa, capacidade de trabalho e sacrifício a troco de bem intelectual! Consciente, a Mila, de vir a obter salário menor, enquanto licenciada, do que o auferido hoje .
No remate da cortesia que o palato agradeceu, mais houve que a linda baiana com sol afundo.
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros