Mark Keller – “Melody in Lace”
“Retém as tuas palavras perante todos, mas não perante um amigo.” Abu Said
Na música, no bailado, numa peça de teatro há marcações, andamentos, saída e entradas que importa respeitar. Na vida é o mesmo - uma luz pestaneja duas ou três vezes e apaga-se. É o sinal da mudança, a consciência fugaz do seu reconhecimento. Destas luminescências podemos não dar conta imediata. Só a distância dos dias situam o local da viragem, o momento em que transformámos um moderato num presto ou num allegro.
É tão difícil abandonar o narrador que nos encobre... É tão fácil metaforizar, fabular, largar pegadas pelos escritos, na contradição do medo/esperança de que alguém se debruce sobre eles e percecione os nossos passos... E que necessidade é essa de entreabrir frestas no que ao próprio pertence para espíritos alheios o desflorarem?
Sou incoerente: o anonimato relativo oculta-me e desenho a autora como espelho da mulher que sou. Em que ficamos? Preservo-me ou exponho-me? Porque a prudência espartilha e a cada dia senti mais opressores os atilhos, desapertei-os, aos poucos, até restar um: o núcleo do que sou. E esse não interessa a quem por aqui navega.
A mulher, a autora, a Maria e a narradora. Coincidem aos pares. A Maria narra o que a mulher e autora experimentam, intui e fantasia. Denuncia-as, a atrevida. A narradora é o outro vértice deste jogo triangular. E, como em todos os triângulos humanos, há traição. Da mulher a si própria? Da narradora aventureira que denuncia a mulher? De todas numa só que legitimam a narradora no despir do linho fino que as cobre?
CAFÉ DA MANHÃ
Adoçantes
Peregrinando
Brasileiros